domingo, 12 de maio de 2013

CAPÍTULO 57


Na manhã seguinte, Joe disse que meu inseto imaginário não havia dado às caras e, claro, fiz cara de paisagem e desconversei. O dia seguiu normalmente, as pessoas agora conversavam comigo e o pequeno desentendimento entre mim e Blanda não chegou aos ouvidos da diretoria nem do RH. Eu estava começando a apreciar aquela rotina. Eu quase gostava de... Bom, trabalhar. Quase.
Tudo ia bem até que, no meio daquela tarde, recebi um telefonema de Clóvis.
- Você teria tempo para conversar comigo hoje à tarde?
- Não – Respondi secamente.
- Demetria, sei eu você ficou magoada por eu ter escolhido o Jeferson em vez do Joe, mas você precisa entender meus motivos. Vamos conversar, ainda podemos nos entender.
- Estou ocupada. Quem sabe outro dia... – Ou em outra vida.
- Deixa de ser teimosa. Você e eu sabemos que você vai vir de qualquer forma. Mandarei um motorista para te pegar. O que acha? – ele disse melosamente.
- Bom... – O que eu tinha a perder? E, se eu fosse dar ouvidos a vovô e a toda aquela balela de Sun Tzu, o negócio era manter o inimigo (tá certo, Clóvis não era meu inimigo, mas definitivamente não era meu amigo, não depois do que fez!) perto, não era?
O carro de Clóvis chegou meia hora depois. Avisei Joe que teria que sair mais cedo, mas não dei detalhes, mesmo porque eu mesma não os conhecia ainda. Fiquei sem chão quando o motorista embicou o carro no portão da mansão e não no escritório de Clóvis. Um misto de nostalgia e pesar me perpassou. Tudo estava perfeitamente igual naquela propriedade e, no entanto, tão diferente. Faltava alma naquela casa.
Clóvis me aguardava no jardim. Parecia amistoso, sorrindo recostado no espaldar da cadeira de madeira.
- Que bom que você veio.
- Pode parar com a bajulação e ir direto ao que interessa. Eu ainda não engoli aquela história da promoção do Joe.
Ele esperou que o motorista se afastasse e indicou a cadeira ao seu lado para que eu me sentasse. Não sentei.
- Eu nunca quis prejudicar o Joe. Fiz o que achei melhor para a empresa – começou Clóvis, com a voz monótona de sempre.
- Você foi um calhorda. Todo mundo sempre diz para não confiar nos advogados... – grunhi.
Ele sorriu, se desculpando.
- Não me tome por um calhorda. Só estou pensando no seu futuro, afinal a L&L será sua muito em breve. Tem certeza que não quer sentar? Vou pedir um chá e...
- Não, obrigada. Onde está a Telma?
- Nos Andes. Infelizmente não pude ir com ela. Muita coisa para fazer por aqui. Eu sei que você me culpa, Demetria, mas tente entender o meu lado. – Ele se recostou na cadeira, parecendo exausto. – Eu também tenho que abrir mão de muitas coisas para cumprir as ordens do seu avô. Pense nisso antes de me odiar.
Suspirei longamente antes de ceder e me sentar ao seu lado.
- Eu não te odeio. – Não muito. - Por que você me chamou aqui, Clóvis? –  Uma borboleta  azul, quem poderia imaginar?  flutuou ao meu redor. Fiquei rígida como uma estaca, meu coração pulsando na garganta. Mas o inseto asqueroso logo terminou seu círculo predatório e se afastou, entrando na mansão pela janela da biblioteca de vô Narciso. Eu me perguntei o que estaria acontecendo com o mundo. De onde tinham saído tantas borboletas azuis?
Fui arrancada de meu devaneio ao ouvir um ronco familiar. Um ronronar agressivo, feroz, potente, que arrepiava os cabelos da minha nuca. Meus olhos foram arrastados para a fúria vermelha que deslizava para fora da garagem. As rodas brilhantes como prata pura, a carroceria baixa e elegante, o rugido suave, apenas um prelúdio de sua ira.
- Meu Porsche! – exclamei, atordoada.
- Ah, sim. Você reconheceu – Clóvis sorriu – Acabei de comprar. O antigo dono não se deu muito bem com ele.
- Como assim, não se deu muito bem? Meu cupê é perfeito! – me empertiguei.
- Sim, mas ele achou pouco prático para as estradas que temos aqui – ele deu de ombros.
Revirei os olhos. Pra que tipo de mané vendi meu carro?
- Eu não gosto muito desse tipo de carro, mas me pareceu um bom investimento – ele disse.
Olhei para o carro, incapaz de conter o sorriso.
- Um ótimo investimento. Um ótimo carro. Não tem outro melhor que esse. – Assim como uma mariposa atraída para a luz, fui atraída para o meu cupê. Deslizei a mão em suas curvas, do capô ao teto, acariciando a tinta brilhante. – Linhas perfeitas, aerodinâmica imbatível, motor agressivo. Ele é todo perfeito.
- Era sobre isso que eu queria lhe falar – ele sorriu, se colocando ao meu lado. – Eu gosto de carros menos agressivos e a Telma não dirige. Esse cupê vai acabar ficando encostado na garagem por... – deu de ombros – muito tempo. O que você acha de ficar com ele por um tempo?
- O quê?
- Você me disse que detesta o transporte público, e não tiro sua razão. Realmente não funciona na maior parte do país. Você estaria me fazendo um grande favor ficando com o carro até eu decidir o que fazer com ele.
Uau! Não, quero dizer, UAU!
- Acho que posso te ajudar – sorrir, já antecipando a sensação do pequeno pedal sobe meu pé, o câmbio curto e preciso, as curvas deliciosas que nenhum outro carro era capaz de fazer.
- Mas – ele continuou – eu gostaria de pedir um favor em troca.
Enrijeci. Por alguma razão, eu soube que acabara de cair numa armadilha.
- E o que seria? – inquiri, estreitando os olhos.
- Gostaria que você reavaliasse a sua vida. Demetria, apelar para o bom-senso não parece surtir efeito com você, mas e eu não sei mais o que fazer. O Hector esteve aqui ontem. Parece que alguém andou falando com ele – Lutei para não gritar. Blanda merecia uma boa surra por ter aberto a boca para Hector, isso o era certo. – Ele tem certeza que não ouviu apenas boatos. Ele está seriamente preocupado e, Demetria, o Hector é implacável. Se ele conseguir provar que você tentou ludibriar todos nós para reaver sua herança, você terá sérios problemas. E, conhecendo o Hector como conheço, ele não vai ser benevolente. Eu já lhe disse que você vai ser excluída do testamento se a farsa for comprovada, não disse?
- Disse. E eu já disse que não é uma farsa.
Ele me ignorou.
- Volta pra casa, Demetria – e abriu os braços, indicando a mansão às minhas costas. – Eu faço o que puder para que tudo volte a ser como era. Você vai ter seu cartão sem limites, vai poder viajar pelo mundo sem preocupações... Você pode ter ainda hoje a vida que tinha antes do seu avô morrer! Seu carro já está aqui – apontou para o Porsche sorrindo, então seu rosto se tornou pesaroso. – Mas, para que eu possa te ajudar, você tem que se ajudar também. Anule o casamento. Se afaste de Joe e o liberte dos problemas que certamente ele vai enfrentar se ficar ao seu lado. Ele não merece isso.
Não, Joe não merecia. Era tentador, eu não podia negar. Deixá-lo livre das complicações que eu trouxera, ter minha vida de volta, minha casa, minha grana, meu carro, minha liberdade de vagar pelo mundo. Só que... não parecia certo. Se Clóvis tivesse feito essa mesma proposta semanas antes, talvez eu nem hesitasse, mas agora... Agora havia Joe e tudo havia mudado. Eu havia mudado.
Passado o momento “estupidez”, me dei conta do que Clóvis realmente estava tentando fazer. Ele estava tentando me comprar. Fiquei envergonhada por cogitar a hipótese de aceitar sua oferta. Vovô ficaria decepcionado comigo. Ele sempre fora o homem mais íntegro que eu conhecia. E eu era sua neta, Demetria Devonne Lovato, e, se meu dinheiro e minha casa haviam sido confiscados, ainda me restava o mais importante, a herança que ninguém jamais poderia arrancar de mim: Meu orgulho. 
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bom vocês foram bem claras que querem mais capítulos e bom ta aí mais um,alguém me perguntou quantos capítulos a fic vai ter bom ela já está finalizada e posso dizer que tem mais de 100 capítulos com o epílogo que ainda estou tentando fazer.  

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