terça-feira, 25 de março de 2014

Amigas Para Sempre capítulo 20

Vinte
Os primeiros doze meses de maternidade foram uma correnteza de águas
revoltas e sombrias que com bastante frequência puxaram Sel para baixo.
Era constrangedor ela ter se descoberto tão despreparada para esse evento abençoado que fora seu sonho secreto de infância. Na verdade era tão constrangedor que ela não contava a ninguém quanto se sentia sobrecarregada às vezes. Quando perguntavam, ela sorria alegremente e dizia que a maternidade era a melhor coisa que havia lhe acontecido. E até era verdade. Só que, às vezes, não era. A verdade era que sua filha maravilhosa, de pele clara, cabelos escuros e olhos castanhos, era mais do que difícil de lidar. Desde o instante em que chegara em casa, Marah estivera doente. Infecções de ouvido se seguiam uma à outra como vagões de um trem. Assim que uma terminava, outra começava. A cólica a fazia chorar inconsolavelmente por horas seguidas. Sel perdera a conta de quantas vezes se vira na sala no meio da noite segurando a filha vermelha e aos berros, enquanto ela própria chorava baixinho. Marah faria 1 ano em três dias e ainda não havia dormido uma noite inteira. Quatro horas era o recorde até então. Assim, nos últimos doze meses, Sel não havia dormido uma noite inteira sequer. Nicholas sempre se oferecia para levantar. No começo, ele chegava até a sair de debaixo das cobertas, mas Sel sempre o parava. Não que quisesse bancar a mártir, embora frequentemente se sentisse uma. Nicholas tinha um emprego, era simples assim. Sel havia desistido da própria carreira para ser mãe. Portanto, levantar no meio da noite era tarefa dela. No começo, ela fazia isso de boa vontade. Depois, pelo menos com um sorriso. Ultimamente, porém, quando Marah dava o primeiro berro às onze da noite, Sel se via rezando para ter força. Havia outros problemas também. Em primeiro lugar, ela estava com uma aparência terrível. Tinha quase certeza de que era mais um dos efeitos da privação de sono. Não havia maquiagem ou hidratante su􀙼cientes. Sua pele, que sempre fora clara, estava absolutamente branca nos últimos tempos, exceto pelas olheiras, que tinham um encantador tom de marrom. Faltavam só 5 quilos para perder todo o peso da gravidez. Mas quando se tem 1,60 metro, 5 quilos representam dois números de roupa. Fazia quase um ano que ela não vestia nada além de agasalhos de moletom. Precisava começar a fazer exercícios. Na semana anterior, encontrara suas antigas fitas de ginástica de Jane Fonda, um collant e polainas. Agora, tudo o que precisava fazer era apertar o play e começar.
– Vai ser hoje – disse ela em voz alta enquanto levava a filha de volta para a
cama e a deitava gentilmente para dormir.
Cobriu-a com o caro cobertor de caxemira rosa e branco dado por Demi.
Luxuosamente macio, era com ele que Marah dormia. Não importava que brinquedos e cobertores Sel oferecesse, o presente de Demi era o que ela queria.
– Tente dormir até as sete horas. A mamãe agradeceria.
Bocejando, Sel voltou para a cama e se aninhou no marido, que a beijou devagar, talvez como se quisesse começar alguma coisa, e murmurou:
– Você é tão linda…
Ela abriu os olhos, encarando o marido com os olhos embaçados.
– Muito bem, quem é ela? O único motivo que você teria para dizer que eu
sou bonita a essa hora da manhã é culpa.
– Você está brincando? Com as suas alterações de humor, ultimamente parece que eu tenho três esposas. A última coisa que eu quero é mais uma.
– Mas sexo seria bom.
– Sexo seria bom. Engraçado você mencionar isso.
– Engraçado de dar risada ou engraçado por você não se lembrar de quando
foi a última vez que fizemos amor?
– Engraçado porque você vai se dar bem neste fim de semana.
– Ah, é? E como?
– Eu já combinei com a sua mãe. Ela vai levar a Marah para a casa dela depois da festa de aniversário, e você e eu vamos ter uma noite romântica no centro de Seattle.
– E se eu não couber em nenhuma das minhas roupas boas?
– Acredite em mim, eu não tenho problemas com nudez. Podemos pedir serviço de quarto em vez de sair. Embora você seja a única pessoa que acha que não perdeu todo o peso. Experimente alguma coisa. Acho que você vai se
surpreender.
– Não é de admirar que eu te ame tanto.
– Eu sou um deus. Não há dúvida quanto a isso.
Ela sorriu e passou os braços ao redor dele, beijando-o suavemente.
Os dois haviam acabado de fechar os olhos de novo quando o telefone
tocou. Sel se sentou devagar e olhou para o relógio: 5h37.
Atendeu no segundo toque, dizendo:
– Oi, Demi.
– Oi, Selly – disse Demi. – Como sabia que era eu?
– Arrisquei.
Sel esfregou a ponte do nariz, sentindo o começo de uma dor de cabeça.
Ao seu lado, Nicholas resmungou alguma coisa sobre pessoas que não sabem ver a hora.
– Hoje é o dia, lembra? A minha reportagem sobre os reservistas que o Bush
chamou para o serviço militar.
– Ah. Sim.
– Você não parece muito empolgada. Eu vou ao ar, Selly.
– São cinco e meia da manhã.
– Ah. Pensei que quisesse assistir. Desculpe por incomodar.
– Demi, espere…
Era tarde demais. O único som na linha era o do tom de discagem.
Sel xingou baixinho e desligou o telefone. Parecia não conseguir fazer nada certo nos últimos tempos. Ela e Demi tinham tão pouca coisa em comum ultimamente que não havia muito sobre o que conversar. Demi não queria ouvir intermináveis histórias “de mãe” e Sel não conseguia suportar muitas histórias sobre a vida e a carreira de Demi. Os cartões-postais e as ligações de lugares distantes e exóticos eram um pouco irritantes.
– Ela vai aparecer no Sunrise hoje – disse Sel. – Queria nos lembrar.
Nicholas jogou as cobertas para o lado e ligou a televisão. Os dois sentaram
juntos e viram a reportagem de Deborah Norville sobre o clima de hostilidade no Iraque e a resposta do presidente. Então, de repente, Demi estava no ar. Estava parada diante de um velho edifício de concreto, conversando com um garoto jovem e saudável com muitas sardas e cabelos vermelhos com corte à escovinha. Ele parecia alguém que estava usando aparelho nos dentes e uma jaqueta colegial dez segundos antes. Mas era Demi quem chamava a atenção. Ela estava arrumada, extremamente profissional e linda. Havia domado os cabelos castanhos com um corte elegante e sofisticado e aplicara maquiagem suficiente apenas para acentuar os olhos.
– Nossa – sussurrou Sel.
Quando aquela transformação havia acontecido? Não era mais a Demetria
exagerada, saída dos anos 1980, da cocaína e do glitter. Era a repórter Demetria Lovato, tão linda quanto Paulina Poriskova, tão profissional quanto Diane Sawyer.
– Nossa mesmo – Nicholas disse. – Ela está maravilhosa.
Ele beijou Sel no rosto e foi para o banheiro. Em seguida, ela ouviu o
chuveiro ser ligado.
– Ela está maravilhosa – resmungou Sel, então suspirou e se virou de lado
para o telefone novamente, discando o número de Demi. A recepcionista da NBC atendeu e disse que ela teria de deixar um recado. Então Demi estava zangada.
– Diga a ela que Selly ligou para dizer que a reportagem estava ótima. Demi provavelmente estava parada ao lado do telefone, usando saia e blusa desenhadas por um estilista, remexendo na bolsa de grife, olhando para a luz piscante do aparelho. Sel saiu da cama e foi até o banheiro. Embaixo do chuveiro, o marido estava cantando uma versão bem desa􀙼nada de uma velha canção dos Rolling Stones.
Contrariando o bom senso, ela se olhou no espelho. Seus cabelos estavam sem corte e compridos demais. As raízes denunciavam quanto tempo fazia desde a última vez que fizera luzes. Estava com bolsas embaixo dos olhos do tamanho de guarda-chuvas abertos e tinha peito suficiente para duas mulheres. Não era de admirar que tentasse se manter afastada de superfícies reflexivas. Com um suspiro, pegou o creme dental e começou a escovar os dentes. Marah acordou antes que ela terminasse.
Desligou a água e abriu a porta para escutar.
Sim, Marah estava berrando.
O dia de Sel havia começado.
Quando chegou o grande dia, Sel se perguntou por que diabos havia planejado uma festa de aniversário tão ridícula para a filha. De manhã, depois de mais uma noite insone, ela se levantou e começou os preparativos, dando os retoques finais no bolo cor-de-rosa da Barbie e embrulhando os últimos presentes. Num momento de evidente loucura, havia convidado todas as crianças da aula “Mamãe e eu” de Marah, além de seus pais e duas antigas
colegas de faculdade que tinham 􀙼lhas mais ou menos da mesma idade. Até mesmo Nicholas havia tirado a manhã de folga para ajudar naquela extravagância. Quando todos chegaram, no horário marcado, trazendo presentes, Sel imediatamente começou a sentir dor de cabeça. Também não ajudou muito o fato de Marah escolher justo aquele momento para começar a berrar. Ainda assim, a festa continuou, com todas as mulheres na sala de estar e as crianças no chão, fazendo mais barulho do que um exército em marcha.
– Vi a sua amiga Demi naquele programa de manhã cedo – comentou Mary
Kay. – Eu estava acordada com o Danny.
– Eu também estava acordada – falou Charlotte, pegando seu café. – Ela
estava ótima, não estava?
– Isso porque ela dorme a noite toda – observou Carol. – E ela não está com as roupas sempre vomitadas.
Sel queria se juntar à conversa, mas não conseguiu. Sua dor de cabeça a estava matando, e ela estava com uma estranha sensação de que havia alguma coisa errada. Isso se intensificou tanto na hora em que Nicholas saiu da festa, pouco depois da uma, que ela quase implorou que ele ficasse.
– Você está incrivelmente quieta hoje – observou sua mãe quando o último convidado foi embora.
– A Marah não dormiu de novo esta noite.
– Ela nunca dorme a noite toda, e por quê? Porque…
– Eu sei, eu sei. Eu preciso deixá-la chorar.
Sel atirou o último copo descartável no lixo.
– Eu simplesmente não consigo.
– Eu deixei você chorar. Depois de três noites, você nunca mais acordou de
madrugada.
– Mas eu sou um gênio. Minha filha não é tão inteligente assim.
– Não, eu sou o gênio. A minha filha não é tão inteligente assim.
A mãe passou um braço pelo ombro de Sel e a levou até o sofá. As duas sentaram lado a lado. Sel se encostou na mãe, que acariciou seus cabelos. O movimento suave e tranquilizador a transportou algumas décadas no passado.
– Lembra quando eu queria ser astronauta e você disse que eu tinha sorte de
a minha geração poder ter tudo? Eu poderia ter três filhos, marido e ainda ir à Lua. Que monte de bobagem isso – suspirou Sel. – É difícil ser uma boa mãe.
– É difícil ser uma boa qualquer coisa.
– Amém – disse Sel.
A verdade era que ela amava a filha, a ponto de às vezes esse amor doer, mas a responsabilidade era enorme, e o ritmo da vida, exaustivo.
– Sei quanto você está cansada. Vai melhorar. Eu prometo.
Mal a mãe disse essas palavras, seu pai entrou na sala. Ele havia passado a maior parte da festa escondido na sala íntima, vendo esportes ou outra coisa na TV.
– É melhor irmos embora, Mandy. Não quero ficar preso no trânsito. Aprontem a Marah.
Sel sentiu um lampejo de pânico.
– Eu não sei, mamãe.
A mãe tocou sua mão suavemente.
– Seu pai e eu criamos dois filhos, Selly. Podemos cuidar da nossa neta por uma noite. Saia com o seu marido. Coloque um salto e se divirta. A Marah ficará bem conosco.
Sel sabia que a mãe tinha razão. Sabia inclusive que era uma coisa boa a se fazer. Então por que estava com o coração apertado?
– Você tem uma vida inteira para sentir medo – disse o pai. – Ter filhos é
isso. É melhor se acostumar, querida.
Sel tentou sorrir.
– Então era assim, é? Era assim que vocês se sentiam o tempo todo?
– É como ainda nos sentimos – confessou seu pai.
A mãe a pegou pela mão.
– Vamos arrumar as coisas de Marah. Nicholas vai estar em casa dentro de duas horas para buscar você.
Sel arrumou as roupas de Marah, garantindo que estivesse levando o cobertor cor-de-rosa, as chupetas e o adorado ursinho Puff. Separou o leite, as mamadeiras e os potinhos com frutas e legumes picados. Fez uma tabela com os horários de refeição e de sono que orgulharia um controlador de tráfego aéreo. Quando segurou Marah mais uma vez no colo e beijou seu rosto macio, Sel precisou conter as lágrimas. Era ridículo, constrangedor e inevitável, porque não importava que a maternidade estivesse lhe dando uma surra e acabando com sua autoconfiança, a maternidade também a havia inundado de amor, de tal forma que de alguma maneira era apenas metade de si mesma sem a filha.
Sel ficou parada na varanda da casa nova de frente para a praia na ilha Bainbridge, com a mão protegendo os olhos do sol, até muito tempo depois de o carro dos pais ter desaparecido. Depois, dentro de casa, andou de um lado para outro, perdida, por alguns instantes, sem saber ao certo como ficar sozinha.
Tentou de novo ligar para Demi. Deixou outro recado.
Finalmente, foi até o closet e ficou olhando para as roupas de antes da gravidez, tentando encontrar algo adulto e sexy que fosse servir. Havia acabado de arrumar a bolsa quando ouviu a porta lá embaixo abrir e fechar e os passos do marido no piso de madeira.
Ela desceu ao encontro dele.
– Aonde vamos, Sr. Ryan?
– Você vai ver.
Ele segurou a mão dela, pegou sua bolsa de roupas e trancou a casa. No carro, o rádio estava ligado em volume alto, como nos velhos tempos. Bruce Springsteen cantava: Hey, little girl, is your daddy home… Sel riu, sentindo-se jovem de novo. Os dois foram até o terminal da balsa e entraram na embarcação que esperava para zarpar. Em vez de ficarem dentro do carro durante a travessia, como de costume, vestiram casacos e chapéus e foram para o convés com os turistas. Eram cinco horas da tarde, e o céu estava parecendo um quadro de Monet, com tons lavanda e cor-de-rosa. A distância, Seattle cintilava com um milhão de luzes.
– Você vai me dizer aonde estamos indo?
– Não. Mas vou dizer o que vamos fazer.
Sel riu.
– Eu sei o que vamos fazer.
Quando a balsa aportou, os dois voltaram para o carro. Depois de saírem da
embarcação, Nicholas guiou no trânsito praticamente parado do centro da cidade até chegarem em frente ao hotel, onde um porteiro uniformizado abriu a porta e pegou suas bolsas.
Nicholas deu a volta e segurou a mão de Sel.
– Já fiz nosso check-in – falou para a esposa e, virando-se para o carregador, disse: – Quarto 416.
Os dois caminharam pelo pátio silencioso e entraram no saguão com estilo
europeu. No quarto andar, foram para seu apartamento, uma suíte de canto
com uma vista impressionante. A ilha Bainbridge parecia quase púrpura. A água estava muito azul e as montanhas ao longe tinham uma luz rosada ao fundo. Em cima de uma mesa ao lado da janela, uma garrafa de champanhe repousava dentro de um balde de gelo prateado com uma travessa de morangos ao lado.
Sel sorriu.
– Estou vendo alguém que quer se dar bem de qualquer maneira.
– O que você está vendo é um homem que ama a esposa.
Nicholas a pegou nos braços e a beijou.
Quando alguém bateu à porta, os dois se separaram como dois adolescentes
pegos em flagrante, e acharam graça da própria paixão.
Sel esperou impacientemente que o carregador saísse. No instante em que
a porta se fechou, ela começou a desabotoar a blusa.
– Não sei ao certo o que vestir esta noite.
Quando Nicholas olhou para ela – não estava mais sorrindo, parecia tão faminto quanto ela –, Sel abriu o zíper da calça e a deixou cair no chão. Pela
primeira vez em muitos meses, não se preocupou com o peso que havia ganhado. Em vez disso, deixou que o olhar do marido lhe servisse de espelho.
Abriu o sutiã, o segurou por alguns instantes na ponta dos dedos, então o deixou cair no chão.
– Não é justo começar sem mim – disse Nicholas.
Ele arrancou a camisa, que atirou para o lado, e desabotoou a calça.
Os dois caíram na cama juntos e fizeram amor como se não fizessem havia
meses em vez de semanas, entregando-se por completo, mente e corpo. As
sensações arrebataram Sel. Quando Nicholas finalmente a penetrou com todo o desejo acumulado de muitas noites sem paixão, ela gritou de prazer, e tudo o que havia dentro dela, tudo o que ela era, se fundiu àquele homem a quem amava mais do que à própria vida. Quando chegou ao orgasmo, foi com um tremor que a fez abraçar-se ao corpo úmido de suor dele, totalmente entregue.
Ele a puxou contra seu corpo. Nus, arfando, os dois ficaram deitados enroscados um no outro, com os lençóis caros do hotel enrolados em suas pernas nuas.
– Você sabe quanto eu te amo, não sabe? – disse ele baixinho.
Eram palavras que ele dissera centenas de vezes, tão frequentemente que ela conhecia com exatidão o som de cada uma.
Ela se virou de lado, preocupada.
– O que houve?
– Como assim?
Ele se afastou e foi até a mesa, onde serviu duas taças de champanhe.
– Quer morangos?
– Olhe para mim, Nick.
Lentamente – lentamente demais – ele se virou, mas não a encarou.
– Você está me assustando.
Ele foi até a janela e olhou para fora. De perfil, de repente pareceu tenso,
distante. Os cabelos úmidos e desordenados cobriam seu rosto. Ela não sabia se ele estava sorrindo.
– Não vamos fazer isso agora, Selly. Temos a noite inteira e todo o dia de amanhã para conversar. Agora, vamos…
– Me diga.
Ele pôs a taça de champanhe no peitoril da janela e se virou para ela.
Finalmente, deixou o olhar cruzar com o dela, e nos olhos azuis do marido ela viu o tipo de tristeza que a fazia ficar sem fôlego. Ele foi até a cama, se ajoelhou ao lado dela de modo a olhar para cima enquanto conversava com Sel.
– Você sabe o que está acontecendo no Oriente Médio.
As palavras dele foram tão inesperadas que ela apenas o encarou.
– O quê?
– Vai haver uma guerra, Selly. Você sabe disso. O mundo todo sabe.
Guerra.
A palavra se transformou em algo grande e escuro como uma nuvem de tempestade. Ela sabia o que aquilo significava.
– Eu preciso ir.
A forma simples e tranquila com que ele disse isso foi pior do que qualquer berro.
– Você me disse que havia perdido a coragem.
– Essa é a ironia. Você me devolveu a coragem. Cansei de me sentir fracassado, Selly. Eu preciso provar a mim mesmo que vou conseguir desta vez.
– E quer a minha bênção – disse ela com tristeza.
– Eu preciso.
– Você irá independentemente do que eu disser, então por que todo o teatro?
Ele se levantou, segurou o rosto da esposa. Ela tentou se afastar, mas ele não deixou.
– Eles precisam de mim. Eu tenho experiência.
– Eu preciso de você. Marah precisa de você. Mas isso não tem importância, não é?
– Tem, sim.
Sel sentiu o calor das lágrimas enchendo seus olhos, borrando sua visão.
– Se você disser não, eu não vou.
– Está bem. Não. Você não pode ir. Não vou deixar. Eu o amo, Nicholas.
Você poderia morrer lá.
Ele a soltou, se agachou e a encarou.
– Essa é a sua resposta?
As lágrimas rolaram, molhando seu rosto. Com raiva, Sel as secou. Queria dizer Sim, porra, sim, essa é a minha resposta.
Como poderia negar aquilo a ele? Não apenas era o que ele queria, como ainda mais fundo havia outra coisa, aquele resquício surrado e feio de medo que retornava à superfície às vezes, que a lembrava que ele havia amado Demi primeiro. Ele fazia com que Sel tivesse medo de negar qualquer coisa a ele.
Secou os olhos mais uma vez.
– Prometa que não vai morrer, Nicholas.
Ele subiu na cama e a tomou nos braços e, embora ela o segurasse com toda
a força possível, já não se sentia segura. Sentia como se ele desmanchasse em seu abraço, desaparecendo pouco a pouco.
– Eu prometo que não vou morrer.
Eram palavras vazias, agravadas pelo fervor com que ele as pronunciou.
Sel não conseguiu deixar de pensar na sensação que tivera naquela manhã
de que alguma coisa daria errado.
– Estou falando sério, Nicholas. Se morrer, vou odiar você para sempre. Juro por Deus.
– Você sabe que vai sempre me amar.
Aquela frase e a facilidade e o ar de vitória com que ele a pronunciou fizeram com que ela tivesse vontade de chorar tudo de novo. Foi apenas muito mais tarde, depois que os dois tiveram um jantar romântico no quarto, fizeram amor e se aninharam nos braços um do outro, que ela pensou no que dissera a ele, no horror absurdo e violento da ameaça que fizera em nome de Deus.
Demi soltou o corpo nu de Sterling e se jogou na cama, ainda respirando com
dificuldade.
– Nossa – disse ela, fechando os olhos. – Foi ótimo.
– Foi mesmo.
– Estou tão feliz que você esteja na cidade este fim de semana. Era exatamente o que eu estava precisando.
– Nós dois, querida.
Demi adorava ouvir o sotaque dele, sentir o corpo nu dele contra o seu. Era
um momento para aproveitar, a que se prender, inclusive, porque assim que ele saísse da sua cama, ela sabia que o desconforto voltaria. Vinha lutando contra aquilo desde o dia anterior, quando brigara com Sel. Nada era capaz de perturbar sua autoconfiança ou deixá-la tensa como ficar irritada com Sel.
Sterling sentou na cama.
Ela tocou nas costas dele. Pensou em pedir que passasse a noite com ela, que adiasse sua reunião, mas não era esse o tipo de relacionamento que os dois tinham. Eram amigos que se encontravam para transar e dar risada por algumas horas e depois seguiam seus próprios caminhos. Ao lado dele, o telefone da mesa de cabeceira tocou. Ele estendeu a mão.
– Não atenda. Não quero falar com ninguém.
– Eu dei este número para o escritório.
Ele levantou o fone e atendeu à ligação.
– Alô? … Sterling – disse. – E quem é você? Ah, entendo. – Ele fez uma
pausa, franzindo a testa, e então deu risada. – Eu posso fazer isso. – Segurou o fone contra o peito nu e se virou para Demi. – A sua melhor amiga para todo o sempre está dizendo, e vou citar palavra por palavra, que é para você levantar a sua bunda branca da cama e atender o maldito telefone. Ela disse ainda que se você continuar com essa merda justamente hoje, ela vai bater em você até que implore por misericórdia. – Ele riu de novo. – Ela parece estar falando sério.
– Vou atender.
Sterling passou o fone para ela e seguiu nu em direção ao banheiro. Quando
ele fechou a porta, Demi levou o fone ao ouvido e perguntou:
– Quem está falando?
– Muito engraçado.
– Tive uma melhor amiga para todo o sempre um dia, mas ela foi uma verdadeira vaca, então eu imaginei que…
– Olhe, Demi, normalmente eu iria rastejar por uma hora ou mais e pediria desculpas, mas não tenho tempo para esse ritual hoje. Sinto muito. A sua ligação foi numa hora ruim, e eu fui insuportável. Tudo bem?
– Qual é o problema?
– É o Nicholas. Ele está indo para Bagdá amanhã.
Demi devia ter previsto isso. Toda a emissora estava falando sobre o que acontecia no Oriente Médio. Todo mundo na emissora e ao redor do planeta especulava sobre quando o presidente Bush iria lançar a primeira bomba.
– Um monte de jornalistas está indo para lá, Selly. Ele vai ficar bem.
– Eu estou com medo, Demi. E se…
– Não – disse Demi enfaticamente. – Nem pense nisso. Eu vou acompanha-lo da emissora. Nós recebemos a maior parte das notícias primeiro. Vou ficar de olho por você.
– E vai me contar a verdade, aconteça o que acontecer?
Demi suspirou. A promessa familiar das duas não pareceu tão leve e cheia de
esperanças como de costume. De repente, tinha um componente sombrio e sinistro que ela precisou se forçar a ignorar.
– Aconteça o que acontecer, Selly. Mas não precisa se preocupar. Esta guerra não vai durar muito tempo. Ele vai voltar para casa antes de Marah dar o primeiro passo.
– Vou rezar para você ter razão.
– Eu sempre tenho razão. Você sabe disso.
Demi desligou o telefone e  ficou escutando o barulho de Sterling tomando
banho. A cantoria dele, que normalmente a fazia sorrir, não surtiu efeito.
Nicholas em Bagdá.
Selly recebeu a primeira mensagem de Nicholas quatro dias depois de ele
partir. Até então, ficara caminhando atordoada pela casa, sempre perto do novo aparelho de fax que haviam instalado no balcão da cozinha. Enquanto fazia as atividades do dia – trocar fraldas, contar histórias, ver Marah engatinhar de um móvel potencialmente perigoso a outro –, ela pensava: OK, Nicholas, me diga que você está vivo e bem. Ele dissera a ela que os telefonemas só poderiam ser feitos em caso de absoluta necessidade (ao que ela argumentou que a necessidade dela era absoluta e perguntou por que isso não contava), mas que enviar fax não apenas era possível como relativamente simples. Assim, ela estava esperando.
Quando o telefone tocou às quatro da manhã, Sel atirou o cobertor para longe e rolou para fora do sofá, tropeçando a caminho da cozinha, à espera da mensagem ser impressa.
Antes que lesse uma palavra, começou a chorar. Só de ver os garranchos dele escritos com caneta de ponta grossa a saudade que sentia ficou quase insuportável.
Querida Selly,
Está uma loucura aqui. Completamente maluco. Não sabemos ao certo o que está acontecendo – agora é esperar. Os jornalistas estão todos no hotel Al-Rashid no centro de Bagdá e temos acesso sem precedentes aos dois lados.
A cobertura desta guerra irá mudar tudo. Amanhã vamos deixar a cidade pela primeira vez. Não se preocupe. Vou tomar cuidado. Preciso correr. Dê um beijo em M. por mim.
Te amo
N.
Depois disso, os faxes começaram a chegar mais ou menos uma vez por semana. Nem de perto a frequência que Sel desejava.
S.,
O bombardeio começou ontem à noite. Ou eu deveria dizer esta manhã?
Tínhamos uma visão privilegiada do hotel, e foi algo violento, terrível e impressionante. Era uma noite maravilhosa e estrelada em Bagdá, e as bombas transformaram a cidade num inferno. Uma torre de escritórios explodiu perto do hotel, e o calor foi como o de uma fornalha. Estou tomando cuidado.
Te amo
N.
S.,
Dezessete horas de bombardeios e eles continuam. Não sobrará nada quando isso chegar ao fim. De volta ao trabalho.
S.,
Desculpe por fazer tanto tempo desde a última mensagem, mas a equipe está tão envolvida em pautas que eu não consigo cinco segundos para mim mesmo. Mas estou bem. Cansado. Caramba, mais do que isso. Exausto. A primeira prisioneira de guerra dos Estados Unidos foi capturada ontem à noite, e preciso dizer que isso nos atingiu em cheio. Espero que algum dia eu consiga lhe contar como é a sensação de ver tudo isso, mas não posso pensar assim agora, não se quiser dormir. De qualquer maneira, estão dizendo que os iraquianos vão incendiar poços de petróleo no Kuwait, e iremos cobrir isso.
Beijos em Marah e mais ainda em você.
Sel olhou para o último fax que havia recebido. Estava datado 21 de fevereiro de 1991, fazia quase uma semana.
Estava sentada na sala de estar, assistindo à cobertura da guerra pela televisão. As últimas seis semanas haviam sido os dias mais longos e mais difíceis de sua vida. Ela estava esperando, sempre esperando, por um telefonema que dissesse que ele estava voltando para casa, por um plantão especial que anunciasse o fim da guerra. Agora diziam que o ataque final dos
aliados poderia começar a qualquer instante. Um ataque por terra. Isso a assustava tanto ou mais do que qualquer outra coisa, porque ela conhecia seu
Nicholas. De alguma forma, ele acabaria num tanque, dirigindo uma reportagem que ninguém mais poderia fazer.
A espera a havia reduzido a nada. Ela havia perdido 7 quilos e não tivera uma boa noite de sono desde aquela que os dois passaram no hotel. Dobrou ao meio o último fax que recebera e o pôs em cima da pequena pilha de faxes. Todos os dias prometia a si mesma que não os desdobraria para reler as palavras dele. Todos os dias voltava àqueles papéis. Naquele dia, havia começado várias tarefas e deixado todas inacabadas. Em vez de concluí-las, ficara sentada no sofá, vendo televisão. Estava ali havia mais de duas horas.
Marah estava parada ao lado da mesa de centro, segurando as bordas de madeira com as mãozinhas rosadas e gorduchas, dançando como uma dançarina de break e tagarelando em linguagem de bebê. Finalmente, se jogou de bunda no chão e logo começou a engatinhar para longe do sofá.
– Fique perto da mamãe – disse Sel automaticamente.
Na TV, os poços de petróleo estavam queimando. O ar acima deles era uma
nuvem espessa de fumaça preta.
Do outro lado da sala, Marah encontrou alguma coisa. Sel percebeu pelo
silêncio repentino. Deu um salto e foi até a poltrona ao lado da lareira.
A poltrona de Nicholas.
Nem pense nisso. Ele vai estar de volta a qualquer hora para sentar aí novamente e ler o jornal depois do trabalho.
Sel se abaixou e pegou no colo a filha curiosa, que olhou para ela com seus
imensos e brilhantes olhos castanhos e começou a falar. Sel não conseguia
deixar de sorrir com o esforço que Marah estava fazendo para tentar se
comunicar, e, como sempre, a alegria evidente da filha a deixava animada.
– Ei, pequenininha, o que você descobriu aí?
Levou-a de volta para o sofá e desligou a TV no caminho. Chegava daquilo.
Preferiu ligar o rádio. Estava sintonizado numa estação de músicas antigas, o que sempre a fazia parar para pensar. Em sua mente, os anos 1970 não eram tão distantes. The Eagles estavam cantando “Desperado”. Sel deixou que a música a transportasse para um tempo em que tudo era mais simples. Segurando a filha no colo, ela dançou pela sala, cantando com o rádio. Marah dava risada e saltitava em seu colo, o que fez Sel dar risada pela primeira vez em dias. Beijou o rosto fofo da filha, cheirou o pescoço aveludado e lhe fez cócegas até que ela desse gritinhos de alegria. As duas estavam se divertindo tanto que Sel não registrou imediatamente que o telefone estava tocando. Quando o ouviu, correu até o rádio, abaixou o volume e atendeu a ligação.
– Sra. Ryan?
A ligação estava ruim. Era claramente uma chamada de longa distância.
Apenas em casos de necessidade absoluta.
Ela congelou, segurou Marah com mais força, e a menininha se agitou em
seus braços.
– É ela.
– Aqui é Lenny Golliher. Sou amigo do seu marido. Estou aqui em Bagdá com ele. Sinto ter que lhe dizer isso, Sra. Ryan, mas houve um bombardeio ontem…
O maître levou Edna à sua mesa de sempre, e Demi a acompanhou de perto,
tentando não ficar embasbacada com todos os poderosos e famosos que almoçavam lá. Claramente, aquele era um dos lugares para ver e ser visto em
Manhattan. Edna parou em quase todas as mesas para cumprimentar alguém e apresentou todos a Demi, dizendo:
– Eis uma garota em quem você precisa ficar de olho.
Quando chegaram à mesa delas, Demi teve a impressão de estar flutuando.
Mal podia esperar para ligar para Sel e contar que havia conhecido John Kennedy Júnior.
Ela reconhecia o valor do que havia acabado de acontecer. Edna acabara de
lhe dar o presente do reconhecimento.
– Por que eu? – perguntou, quando o garçom saiu.
Edna acendeu o cigarro e se recostou na cadeira. Acenando com a cabeça para alguém do outro lado do salão, ela pareceu não ter escutado a pergunta.
Demi estava prestes a perguntar de novo, quando Edna disse baixinho:
– Você me lembra de mim mesma. Vejo que ficou surpresa.
– Fiquei lisonjeada.
– Sou de uma cidadezinha de Oklahoma. Quando cheguei a Nova York com um diploma em jornalismo e um emprego de secretária, descobri a crua verdade desta carreira. Praticamente todo mundo é alguém ou é parente de alguém. Um ninguém precisa trabalhar muito. Não acho que eu tenha dormido mais do que cinco horas seguidas, passado um Natal com a família ou feito sexo que significasse alguma coisa por quase uma década.
O garçom trouxe os pratos das duas, os pôs diante delas com um aceno de cabeça e desapareceu novamente. Com o cigarro aceso na mão, Edna começou a cortar seu filé.
– Quando vi você, pensei: ali está a jovem que eu vou ajudar. Não sei por quê, exceto pelo fato de que, como eu disse, você me fez lembrar de mim mesma.
– Meu dia de sorte.
Edna assentiu e voltou à comida.
– Sra. Guber? – Era o maître novamente, trazendo um telefone. – Ligação
urgente para a senhora.
Ela atendeu o telefone e disse:
– Pode falar.
Então ficou escutando por um longo tempo.
– Quais os nomes deles? Como? Bomba? – falou, e começou a tomar notas.
– Repórter morto, produtor ferido.
Demi não escutou nada depois de produtor. A voz de Edna virou apenas um
ruído. Inclinou-se para a frente.
– Quem foi?
Edna apertou o telefone contra o peito.
– Dois caras da afiliada de Seattle se feriram num bombardeio. Na verdade,
o repórter morreu. O produtor, Nicholas Ryan, está em estado grave – explicou Edna, depois voltou para a ligação: – Qual era o nome do repórter?
Demi sentiu o corpo inteiro congelar. Começou a tremer. Tudo o que conseguia pensar era: Nicholas. Fechou os olhos, mas não ajudou. Na escuridão, reuniu várias lembranças dolorosas: os dois sentados na doca da casa flutuante dele, falando sobre seu futuro… eles dançando naquele clube noturno ridículo na pior parte do centro da cidade tantos anos antes… a vez em que o viu olhando para Marah pela primeira vez, com os olhos cheios de lágrimas.
– Ah, meu Deus – disse ela, levantando-se. – Preciso ir.
Edna olhou para ela e fez com a boca:
– O que foi?
Mal conseguiu formar as palavras, que lhe queimaram a boca.
– Nicholas Ryan é o marido da minha melhor amiga.
– É mesmo? – falou Edna, encarando-a, então disse ao telefone: – Maury,
ponha Demi nesta história. Ela tem um contato. Já ligo de volta.
Desligou.
– Sente-se, Demi.
Anestesiada, ela obedeceu. Suas pernas estavam praticamente inúteis, de qualquer maneira. Aquelas lembranças não paravam de martelar em sua cabeça.
– Eu preciso ajudar a Selly – murmurou ela.
– É uma matéria importante, Demi – ressaltou Edna.
Demi fez um aceno impaciente com a mão.
– Eu não me importo com isso. Ela é a minha melhor amiga.
– Não se importa? – repetiu Edna com firmeza. – Ah, se importa, sim. Todo
mundo quer essa pauta, mas você tem um contato. Sabe o que isso significa?
Demi franziu a testa, tentando mudar de foco. Parecia vagamente errado fazer com que aquilo tivesse relação com sua carreira.
– Não sei.
– Então não é a mulher que eu pensei que fosse. Você pode conseguir uma
exclusiva e confortar a sua amiga ao mesmo tempo.
Demi pensou a respeito.
– Vendo por este ângulo…
– Qual é o outro ângulo? Você pode fazer uma entrevista que ninguém mais vai ter. Uma coisa dessas pode botar você no mapa. Pode garantir o seu espaço no núcleo de notícias.
Demi não pôde deixar de se sentir seduzida por isso. O núcleo de notícias era a equipe que cobria as principais matérias do dia. O fator de reconhecimento para qualquer um que fosse designado para essa equipe era alto. Exposição nacional diária. Várias pessoas saltaram direto do núcleo de notícias para a apresentação de programas.
– E eu posso proteger Sel de tudo enquanto estiver lá.
– Exatamente.
Edna pegou o telefone e discou um número.
– A Lovato pode nos conseguir uma exclusiva, Maury. Considere como feito.
Ela tem o meu aval.
Quando desligou, Edna olhou com firmeza para Demi.
– Não me decepcione – falou.
No caminho do restaurante até a emissora, Demi convenceu a si mesma que havia feito a coisa certa. Em sua mesa, atirou o casaco nas costas da cadeira e ligou para Sel.
O telefone tocou e tocou. Finalmente, a secretária eletrônica atendeu.
Você ligou para a casa dos Ryan. Nem o Nicholas nem a Sel podem atender
agora, mas deixe um recado que entraremos em contato assim que possível.
Depois do bipe, Demi disse:
– Oi, Selly, sou eu. Acabei de ficar sabendo…
Sel atendeu o telefone e desligou a secretária eletrônica.
– Oi – disse ela, parecendo completamente perdida. – Você recebeu o meu recado. Desculpe pela secretária. Os repórteres sanguessugas não me deixam em paz.
– Selly, como…
– Ele está num hospital na Alemanha. Vou pegar um avião militar em duas horas. Ligo para você quando aterrissar.
– De jeito nenhum. Vou me encontrar com você no hospital.
– Na Alemanha?
– É claro. Não vou deixar você passar por isso sozinha. A sua mãe está com
a Marah, certo?
– Isso. Você está falando sério, Demi?
O tom de voz de Sel ficou mais alto ao final da pergunta, ganhando um pouco de esperança.
– Melhores amigas para sempre, não é?
– Aconteça o que acontecer – e, dizendo isso, a voz de Sel embargou. – Obrigada, Demi.

Demi quis dizer que era para isso que serviam as amigas, mas as palavras ficaram presas em sua garganta. Tudo em que conseguiu pensar foi na entrevista exclusiva que havia prometido a Edna.