- Sel, aconteceu uma
catástrofe! - chorei ao telefone.
- Ah, não! O que foi? Você
está bem? Claro que não está bem, que pergunta imbecil! Você está ferida? O que
aconteceu? Fala, criatura! - cuspiu ela, sem parar para respirar.
- Me apaixonei por meu
marido! - gemi.
- Ah, isso... - ela
exclamou, pouco surpresa. - Onde você está?
- Em casa. Acho que o Joe
foi correr. Ainda não vi ele hoje.
- Estou indo pra aí - ela
desligou.
Enquanto Selena não
chegava, preparei um queijo frio - eu não aguentava mais queijo quente, a única
refeição que era capaz de preparar sozinha - e um cappuccino daqueles de sachê,
com gosto de meia suja. Repassei na cabeça a noite anterior, do momento em que
fui para cama após Joe e eu brindarmos à sua não promoção até o instante em que
sonhei com meu avô. Joe aceitara tudo muito bem, o que me fazia pensar que
talvez ele reagisse da mesma forma quando soubesse o real motivo de Jeferson
ter ficado com a vaga no Comex. Mas então uma vozinha irritante gritava em
minha cabeça: Ah, tá! Até parece!, de modo que deixei tudo como estava.
Sel apareceu com sacolas
cheias de chocolate, sorvete e uma revista de moda ainda no plástico.
- Eu sei, muitas calorias.
Mas achei que fosse uma emergência - explicou, derrubando tudo sobre a pequena
mesa de centro da sala e me abraçando com ternura.
-E é uma emergência -
resmunguei em seu ombro. - Como fui deixar isso acontecer, Sel? Como pude ser tão
burra? Me apaixonar pelo Joe? Isso é ridículo! Vai além do ridículo. Vão ter
que inventar uma palavra nova para definir alguém tão estúpida quanto eu.
Ela se afastou, mas manteve
os dedos fincados em meu ombro.
- Você ama o Joe, tipo ama
mesmo, ou só acha que ama? - perguntou.
- Selena!
- Tô
falando sério, Demi. Muita gente acha que ama alguém, mas não ama de verdade. É
apenas carinho, ou às vezes só tesão mesmo. Me conta o que você sente por ele.
De verdade dessa vez - apenas uma sobrancelha se arqueou.
Suspirei, me jogando no
sofá. Ela se sentou ao meu lado e me entregou uma barra de chocolate.
- Eu não sei o que sinto. É
como se eu sentisse tudo ao mesmo tempo. - Abri a embalagem e dei uma dentada.
- Eu quero tocar o Joe, quero que ele me toque, adoro ouvir o que ele tem a
dizer, amo a forma como a boca dele se enverga num sorriso tímido. Adoro como
ele formula as frases, todo sério, mas dá pra ver uma pontinha de escárnio ali.
Ele é tão gentil e cortês, e me defende quando acha que eu preciso...
- Pensei que você
detestasse ser protegida - ela pegou um pedaço do chocolate e mastigou.
- E detesto! Mas com ele é
diferente. Eu me sinto... Indefesa perto dele, e adoro isso. Ele acaba com
todas as barreiras que eu crio.
- Humm... Me responde uma
coisa. - Ela lambeu os dedos sujos de chocolate. - O que mais te irrita no Joe?
Suspirei.
- Quase tudo.
- Mas você acabou de dizer
que adora um monte de coisas nele.
Afundei a cabeça no encosto
do sofá.
- Eu sei! Eu odeio muitas
coisas no Joe, mas até essas eu amo. Eu sou ridícula!
- Uau! - ela sorriu
enormemente, com um brilho extasiado nos olhos amendoados. - Isso é mais sério
do que eu pensava. O que você vai fazer agora?
- Como assim, o que vou
fazer? - levantei a cabeça.
- Vai contar pra ele?
- Tá maluca? De jeito
nenhum! Vou arrumar uma forma de me desapaixonar, isso sim. Eu não posso amar
meu marido. Além de ser ridículo, vai complicar tudo quando o nosso acordo
terminar e ele sair da minha vida.
- Ele pode se apaixonar por
você - ela cantarolou.
- Não,
Sel. Não pode. O Joe gosta de mim, mas como amiga. Eu conheço ele bem agora.
Ele jamais amaria uma mulher que não admirasse. E tenho certeza que ele não me
admira o bastante para querer se envolver comigo dessa maneira. Ainda mais
depois da noite de ontem. Quando ele souber que não foi promovido por causa de
uma interferência minha, ainda que indiretamente, vai me odiar. Eu sei que vai.
- Fiz um breve relato do que acontecera no jantar da noite anterior. - Entende
agora? O Joe nunca vai me perdoar nem se interessar por mim.
- Ah, Demi. Não fala assim,
como se não tivesse nada em você que atraísse o Joe. Eu já notei. Aquele dia na
pista de dança, eu vi como ele ficou atormentado depois que você deu um agarrão
nele. Você também deve ter notado. Usa isso a seu favor.
Meu queixo caiu.
- Você está sugerindo que
eu...
- Exatamente - ela sorriu,
maliciosa. - Você mora com ele, não é difícil criar o clima certo e encontrar a
hora perfeita, a lingerie perfeita...
Imediatamente, imagens de
Joe e eu rindo, cúmplices, na cama inundaram minha cabeça. Mas eu não podia me
deixar levar pela imaginação. Não dessa vez.
- Não. Não! Nem pensar. Eu
não vou jogar tão baixo. Nem a pau! Eu não quero o Joe só por uma noite, Sel.
Porque seria só uma noite para ele. Eu quero que ele me ame... - Então pensei
melhor. - Não! O que eu quero é deixar de amar o Joe!
- E por que você não tenta
fazer com que ele te ame? Talvez sondar o território, ver se ele corresponde de
alguma forma ou...
A porta se abriu. Joe
apareceu com toda aquela altura, o corpo glorioso molhado de suor, os cabelos
ensopados e a camiseta branca com grandes manchas úmidas deliciosamente
posicionadas sobre os músculos do peito definido e rígido, encharcando a sala
de testosterona.
- Selena! Como vai? - ele
cumprimentou com um sorriso, tirando do ouvido os fones do MP3.
- Bem, Joe. A Demi me
ligou, espero que não esteja atrapalhando.
- Claro que não. Fique à
vontade. Vou tomar uma ducha e ficar apresentável - ele sorriu para ela. No
caminho para o banheiro, brincou levemente com meus cabelos. - Bom dia,
Demetria.
- Bom dia - murmurei com o
rosto quente.
Sel
esperou que a porta do banheiro se fechasse para pular no sofá.
- Ele brincou com seu
cabelo!
- Ele faria o mesmo com um
chihuahua. Você tinha razão. Eu cometi um erro enorme ao colocar aquele
anúncio. Foi uma tremenda burrada.
Ela meditou sobre o assunto
e subitamente seu humor mudou.
- Quer saber? Você está sob
muita pressão - falou. - Vamos sair um pouco. Que tal darmos uma passada no
antiquário?
- Pensei que você não
quisesse mais nada com o Nicholas- respondi, surpresa.
- E não quero. - Então ela
sorriu, envergonhada. - Quer dizer, não muito.
Sorri.
- Vou pegar minha bolsa. -
Bati na porta do banheiro. - Joe, vou sair.
- Divirta-se - gritou ele
sob o ruído de água caindo.
Fomos no carro de Sel. Eu
detestava ficar sem carro e, a julgar por meu salário, ainda teria muito tempo
antes de poder sequer pensar em comprar um. Talvez eu devesse dar uma olhada no
preço das motos. Não uma Ducati, claro, mas qualquer coisa que me livrasse do
transporte público serviria.
A galeria Renoir estava
aberta, mas, como de costume, deserta. Nicholas me recebeu com um abraço
desajeitado.
- Só porque casou esqueceu
que tem amigo?
- Na verdade, é o trabalho
que está me matando, Nicholas- reclamei. - Olha só meus dedos!
Ele examinou minhas unhas
estragadas pela copiadora e sorriu.
- Eis a prova do crime.
Demetria finalmente é uma trabalhadora - zombou e se voltou com o rosto
apreensivo para minha amiga. - Oi, Selena. Tudo bem?
- Oi - ela sorriu
timidamente - Você não me ligou mais.
- Você pediu que eu não
ligasse - ele respondeu, confuso.
- Eu
sei, mas... Sei lá... - ela desviou os olhos, brincando com o babado da blusa -
Você podia ter tentado me fazer mudar de ideia. Sobre muitas coisas.
Os olhos de Nicholas se
arregalaram.
- Podia? - ele perguntou
surpreso, a voz levemente estrangulada.
- Podia - ela deu de ombros
e sorriu timidamente.
Revirei os olhos e me
afastei para lhes dar mais espaço. Sel era ótima para dar palpites sobre a vida
amorosa dos outros. Uma pena que, quando se tratava da sua, ela não soubesse o
que fazer.
Corri os dedos sobre a
superfície de uma mesa de estilo Luís XV enquanto seguia até a seção de
prataria. Parei perto da porta, examinando o legitimo candelabro de prata
francês da Renascença, a peça mais bonita da loja, quando notei o cartaz colado
na vitrine.
- Nick, vocês estão
contratando?
- Só para os fins de
semana. Vou ter que fechar a loja se não encontrar alguém. Tenho que acabar meu
curso de mergulho - ele explicou.
- Qual é o horário?
- Sábado em horário
comercial e domingo até meio-dia.
- Salário? - eu quis saber
- Como tem adicional de
hora extra, acaba sendo até razoável.
Aquilo seria perfeito.
Grana extra e menos tempo com Joe. Tudo de que eu precisava!
- Tudo bem, eu aceiro -
sorri para ele.
Nicholas pareceu confuso.
- Eu quero o emprego -
expliquei.
- Você... Quer? - Sel me
examinou cuidadosamente.
- Um pouco mais de grana
viria bem a calhar, Sel. Talvez eu consiga guardar um pouco para comprar uma
moto, e além disso eu ficaria fora o fim de semana todo. Evitaria certo
problema - arqueei as sobrancelhas sugestivamente.
Ela
cruzou os braços sobre o peito. Seu rosto era a máscara da reprovação.
- Não acredito que você vai
fugir. Você não é disso!
- Não vou fugir. Só vou
resolver essa confusão. E eu gosto daqui. Gosto dos malucos que às vezes
aparecem por aqui.
- Ei! - resmungou Nick.
- Ah, Nick, qual é? Só
entra doido aqui, admita - brinquei.
- Escuta, Demetria -
começou ele, cauteloso. - Eu gostaria de te dar o emprego, mas preciso de
alguém... Responsável, que abra o antiquário e não durma nas poltronas que
estão à venda.
- Eu mudei. - Ele fez uma
careta. Apressei-me a persuadi-lo. - É sério! Eu não vou dormir nas poltronas
nem vou me atrasar. Prometo dar o melhor de mim. Eu já conheço a loja, sei como
tudo funciona. Você não vai precisar perder tempo explicando nada pra mim.
- Dá uma chance pra ela, Nicholas-
Sel pediu com a voz melosa. - Você mesmo admitiu que vendia muito mais quando
Demi estava aqui.
- Porque ela inventava
histórias malucas e enganava os clientes - apontou ele.
- Mas não é isso que um
empregador espera? Que o funcionário dê o melhor de si e consiga conquistar os
clientes? - ela questionou.
- Bom... É, mas...
- Por que você não faz um
teste? - sugeriu Sel. Vamos deixar a Demi aqui por um tempo e ver como ela se
sai. A gente podia tomar um café ali na esquina enquanto isso ou...
- Tudo bem! - ele a
interrompeu apressadamente e a arrastou pela mão. Ela se virou com o polegar
erguido e piscou um dos olhos antes de passar pela porta.
- Obrigada! - sibilei.
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VAMOS LÁ GENTE COMENTEM!
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posta logo :) lindo adoro a historia
ResponderExcluirlindo cap. posta logooooo
ResponderExcluirby : isa
postaa <3
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