quarta-feira, 24 de abril de 2013

CAPÍTULO 17


- O que você tem hoje garota? - questionou Joyce, jogando uma infinidade de documentos sobre minha pequena mesa. Coloquei os papéis de lado, para que não se misturassem com os que eu estava organizando. Eu já havia feito confusão demais com contratos por um dia. - Você está ainda mais distraída que de costume. 
- Eu...sonhei com meu avô - me ouvi dizendo. 
Ela franziu a testa. 
- Isso é ruim? 
- Não sei - respondi sinceramente. - Ele estava triste e acho que era comigo. 
- Nãããão! Por que ele estaria triste? Será que é por causa da confusão sem tamanho que você causou com os contratos dos chineses, perdendo todos os documentos recentes e deixando a ouvidoria da empresa de cabelo em pé hoje de manhã? - Eu me encolhi, um pouco arrependida por não ter prestado atenção no que estava fazendo quando arquivei os contratos no dia anterior. Ainda bem que agora eu tinha tudo sob controle. - Ou será que ele estaria triste porque você enviou o e-mail com a proposta errada para o nosso cliente mais importante da América Latina, e que, aliás, cancelou o pedido de milhares de caixas de produtos? - Como eu poderia saber que aqueles números não eram os valores dos produtos, e sim os códigos? Não me admirava que o cliente tivesse desistido ao ver aquela quantidade astronômica de zeros. Se alguém tivesse me explicado alguma coisa sobre planilhas... - Não deve ser por isso. Não faço ideia do que fez seu avô ficar chateado com você. 
- O vovô perdeu o direito de ficar chateado comigo quando morreu - resmunguei. 
Por mais que eu quisesse me enganar, sabia que a razão da tristeza estampada em suas feições não era nenhuma daquelas apontadas por Joyce. Nada tinha a ver com chineses ou argentinos. Entretanto, eu não tinha certeza se havia entendido sua única frase. A vitória está reservada para aqueles que estão dispostos a pagar o preço. O que ele quis dizer com isso? 
Sacudi a cabeça e dei de ombros. Foi apenas um sonho. Sonhos normalmente são incompreensíveis. 
Joe entrou na sala, o que até então não havia acontecido. Pelo menos desde que eu começara minha escravidão semi voluntária na L&L. 
- Joyce, preciso que você arrume algumas coisas - pediu ele, me cumprimentando com um rápido aceno de cabeça. Como senão tivesse me visto naquela situação embaraçosa no posto de gasolina algumas noites antes. Como se não tivesse pagado minha dívida e depois me convidado para um café. 
Ela sorriu. Obviamente. Quem não sorriria para o Sr-Eu-Sou-o-máximo? 
-Claro Joe. Do que você precisa? - ela perguntou, toda oferecida. 
- De todos os contratos dos chineses. Os antigos e os novos, se possível. Tudo que você puder encontrar. Parece que a A... - ele me olhou de esguelha e sacudiu a cabeça - alguém fez uma confusão e a ouvidoria quer abrir sindicância para apurar o caso. Os chineses estão furiosos e ameaçaram quebrar o contrato. Isso nos deixaria em péssimos lençóis. 
Joyce fechou a cara. 
- Imaginei que as coisas fossem piorar - ela me lançou um olhar frio. 
- Olha só, eu fui... - comecei. 
- Agora não, Demetria. Você já causou danos demais - Joyce me interrompeu. 
- Eu avisei que não era uma boa ideia me deixar sozinha com aquele monte de arquivos - me defendi. 
- E o que é uma boa ideia deixar perto de você, Demetria? Você só... - O telefone em sua mesa tocou e ela correu para atender. - L&L Cosméticos, bom dia. 
Enquanto Joyce anotava, sorridente, um amontoado de números e nomes, Joe me avaliava a distância. Concentrei-me em grampear os papéis e não os dedos. Eu não gostava do jeito que ele me olhava. Era estranho, invasivo, como se pudesse ver minha alma e não gostasse do que visse. Pelo menos era o que parecia. Ele sempre tinha o cenho franzido quando me observava. 
- Joe - chamou Joyce. - Desculpa , mas preciso providenciar alguns documentos para o Dr. Clovis com urgência. Você pode esperar um pouco? 
O rosto dele se contorceu com angústia. 
- Joyce, é muito importante encontrar esses contratos. Não posso esperar. 
- Não vai ser necess... - tentei, mas ela me interrompeu novamente. 
- Desculpa, Joe. Você vai ter que fazer isso sozinho. Por que não leva a cabeça de vento? - ela apontou para mim. - Quem sabe ela lembra onde guardou os contratos. 
- Ela? - ele perguntou horrorizado. - A Demetria mal sabe tirar cópias! 
Empertiguei-me, pensando se, caso eu grampeasse a cabeça de Joe, os grampos seriam descontados do meu salário. As chances eram grandes. 
- Eu sei. Mil desculpas - disse ela com pesar. - Se eu terminar rápido o que preciso fazer, vou te ajudar. 
- Mas a Demetria não tem ideia do que está fazendo aqui. Ela vai ser ... de pouca ajuda. Por favor, Joyce! 
Estreitei os olhos. Que descontassem os grampos. Eu receberia o abatimento com prazer! 
- Talvez ela se lembre em qual das pastas e em qual dos arquivos colocou os contratos dos chineses. Vale a pena tentar. Sinto muito, Joe. Preciso ir. - Joyce se virou para mim. - Ajude o Joe e não estrague tudo dessa vez - e desapareceu no corredor. 
Ele ficou ali parado, encarando a porta sem parecer acreditar. Depois pressionou a ponte do nariz reto com o polegar e o indicador. 
- Muito bem, vai ter que ser você - anunciou, desanimado. 
- Não tô muito a fim, sabia? Além disso, eu sou de pouca ajuda , não é mesmo? Mas obrigada pelo convite. Quem sabe outro dia... - e continuei a grampear calmamente os papéis. 
- Por favor, Demetria, não seja infantil. Você vai até a sala de arquivos me ajudar. Agora. - uma veia pulsou em sua têmpora. 
- Estou ocupada, não está vendo? - levantei o grampeador. 
- Será que você entende que a empresa vai entrar em crise se eu não apresentar esses documentos em meia hora? - ele vociferou. - Espero que você fique feliz quando a L&L falir e milhares de funcionários ficarem desempregados. 
- Nossa, parece meu avô falando. Demetria a irresponsável, estragando tudo outra vez! Só faltou a parte em que sou enterrada como indigente e minha alma fica vagando por aí. - Grampeei o último bloco e olhei para o rosto irritado de Joe. - Ou essa seria a segunda parte do seu discurso? 
Ele me encarou por um instante. Seu rosto era uma máscara de fúria e incredulidade. 
- Você é... - ele bufou e em seguida me deu as costas. 
- Joe - cantarolei. 
Ele se virou lentamente. 
- O que? - disse com os dentes trincados. 
Levantei-me da mesa, peguei o bloco de papéis devidamente grampeados e me aproximei dele. 
Atirei o calhamaço contra seu peito. 
- O que é isso? - ele pegou a pilha. Analisou a primeira página, voltou os olhos para os meus, depois para os papéis, e começou a folhea-los. - Isso...isso... está tudo aqui? - ele virava as páginas freneticamente. 
- E organizado em ordem cronológica. Não falta nada, pode conferir. Grampeei tudo porque acho que assim fica mais fácil manter tudo junto. Não sei como ninguém pensou nisso antes. 
- Gostamos de usar pastas com ganchos - ele balbuciou, piscando algumas vezes, ainda atônito, encarando os documentos. - Mas...como...quando...? 
- Assim que cheguei e a Joyce me informou o ocorrido, voltei ao arquivo e procurei os contratos. Eu tentei avisar quando vocês tocaram no assunto, mas não quiseram me ouvir - dei de ombros. - O que, de certa forma, foi ótimo. Me deu uma boa perspectiva do que vocês dois pensam ao meu respeito. E só para deixar bem claro, eu não sou burra. Apenas não sabia o que fazer, já que ninguém se deu ao trabalho de me explicar. - Eu me aproximei dele, encarando-o, até que meu nariz ficou a centímetros de seu queixo. Caramba, ele era enorme! E me encarava de volta. Assim de perto, suas íris verdes pareciam ainda mais bonitas. As pequenas pintinhas amarelas brincavam ao redor delas. - A de pouca ajuda aqui acabou de salvar o seu rabo. 
Uma explosão de luz brilhou em seus olhos. Eu não sabia dizer se era de fúria, humilhação, admiração ou outra coisa. Ele parecia bastante alterado. 
- De nada, Joe - sorri. - Estamos quites agora. 
Com deleite, o vi tentar dizer alguma coisa, mas não passou de um balbuciar incompreensível, cheio de "hãs" e "errs" e "eu-eu-eu". Pela primeira vez, Joe não tinha resposta. Sorri satisfeita e o deixei plantado no assoalho de madeira, com a surpresa estampada na cara. 
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Comentem e me deixem feliz, até amanhã gente!

3 comentários:

  1. Annnw, lindo demais u_u essa historia é o maximo, posta logo o próximo, pleease, beeeijos :*

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  2. Estive ausente e muito perdi. Que loucura de homens foi aquela de candidatos da Demi qe HORROR. Tadinha da Demi que sonho mais mal vindo. Tomou bofetada sem mão né Joe

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