Dez
Demi correu todo o caminho até
a parada de ônibus na Rua 45.
– Vaca – murmurou, secando
os olhos.
Quando o ônibus chegou, ela
embarcou e pagou a passagem, resmungando “Vaca” mais duas vezes depois que
encontrou um lugar e sentou. Como Selena podia ter dito aquelas coisas para
ela? – Vaca – resmungou de novo, mas desta vez a palavra saiu com desolação. O
ônibus parou a menos de uma quadra da casa de Joseph. Ela correu pela calçada a
caminho da casinha ao estilo dos anos 1930 e bateu à porta. Ele atendeu quase
que imediatamente, usando uma calça velha de moletom cinza e uma camiseta dos
Rolling Stones. Pelo sorriso dele, Demi percebeu que a esperava.
– Oi, Demi.
– Vamos para a cama –
sussurrou ela com a voz rouca, levando as mãos por baixo da camiseta dele e
tirando-a pela cabeça. Os dois atravessaram a casa se beijando e abraçando, até
chegarem ao pequeno quarto localizado nos fundos. Demi ficou colada nele, com os braços firmes,
beijando-o intensamente. Não olhou para ele, não conseguiu, mas isso não tinha
importância. Quando caíram na cama, estavam ambos nus e ansiosos. Demi se
perdeu e entregou-se à própria dor no prazer que encontrou nas mãos e na boca
dele. Quando acabou, os dois ficaram deitados na cama, enroscados,
e ela tentou não pensar em nada exceto em quanto ele a fazia sentir-se bem.
– Você quer conversar sobre
isso?
Ela se afastou um pouco
dele, deitando nos travesseiros, e ficou
olhando fixamente para o teto liso
que havia se tornado tão familiar para ela quanto os próprios sonhos.
– O que você quer dizer?
– Qual é, Demi?
Ela virou de lado e o
encarou, segurando a cabeça com a mão. Ele a tocou no rosto com um carinho
suave.
– Você e Selena brigaram
por minha causa, e eu sei quanto a opinião dela é importante para você. As
palavras dele a surpreenderam, embora não devessem ter surpreendido. Depois que
ficaram juntos, ela de alguma
forma havia começado a revelar pedaços de si mesma a ele. Começara
acidentalmente, um comentário aqui, outro ali, depois de transarem ou enquanto
bebiam, e de alguma forma a coisa crescera. Ela se sentia segura na cama dele,
livre de qualquer julgamento ou censura. Eram amantes que não se amavam, e isso
tornava a conversa mais fácil. Ainda assim, naquele momento ela percebeu que
ele havia prestado atenção a todo o seu falatório e deixado que as palavras
formassem uma imagem. Saber disso fez com que ela de repente se sentisse menos
solitária e, embora a assustasse, foi algo que não deixava de reconfortá-la.
– Ela acha que é errado
estarmos juntos.
– É errado. Nós dois sabemos
disso.
– Eu não me importo – disse
ela de modo enfático, secando os olhos. – Ela é a minha melhor amiga. Ela deve
me apoiar haja o que houver. A voz de Demi embargou nas últimas palavras, na
promessa que as duas fizeram uma à outra tantos anos antes.
– Ela está certa, Demi.
Você deveria ouvi-la.
Ela ouviu alguma coisa na
voz dele, um estremecimento quase aparente que fez com que ela olhasse no fundo
dos olhos dele, onde viu uma tristeza que a confundiu.
– Como pode dizer uma coisa
dessas?
– Estou me apaixonando por
você, Demi, e queria que isso não estivesse acontecendo – falou ele, com um
sorriso triste. – Não fique tão assustada. Sei que
você não acredita nisso.
A verdade daquelas palavras
pesou no coração de Demi, fez com que se sentisse velha subitamente.
– Talvez um dia eu
acredite.
Pelo menos era nisso que
queria acreditar.
– Espero que sim – disse
ele, dando-lhe um beijo suave nos lábios. – A agora, o que vai fazer a respeito
de Sel?
– Ela não quer falar
comigo, mamãe.
Selena se apoiou na parede estofada
do minúsculo cubículo conhecido como sala do telefone. Havia precisado esperar
por mais de uma hora até chegar sua vez naquela tarde de domingo.
– Eu sei. Acabei de falar
com ela.
É claro que Demi ligaria primeiro. Selena não sabia por que
isso a irritava. Ouviu o barulho de um cigarro sendo aceso do outro lado da
linha.
– O que ela lhe contou?
– Que você não gosta do
namorado dela.
– Só isso?
Selena precisava ser
cautelosa. A mãe iria pirar se descobrisse a idade de Joseph e Demi ficaria muito furiosa
se Selena virasse a mãe contra ela.
– Tem mais?
– Não – respondeu ela com
rapidez. – Ele é completamente errado para ela, mamãe.
– A sua vasta experiência
com homens lhe diz isso?
– Ela não foi à última
festa porque ele não quis ir. Ela está deixando de aproveitar a vida
universitária.
– Você realmente achou que Demi
seria uma garota de república igual a qualquer outra? Qual é, Selly? Ela é…
dramática. Cheia de sonhos. Não faria mal a você ter um pouco desse fogo,
aliás.
Selena revirou os olhos.
Sempre havia a sutil – ou nem tão sutil – pressão para ela ser como Demi.
– Não estamos falando sobre
o meu futuro. Foco, mamãe.
– Só estou dizendo que…
– Eu ouvi o que você disse.
Então o que eu faço? Ela está me evitando. Eu estava tentando ser uma boa
amiga.
– Às vezes, ser uma boa
amiga é não dizer nada.
– Então eu devo apenas
ficar assistindo a ela cometer um erro.
– Às vezes, sim. E depois
você fica por perto para juntar os
cacos. Demi tem uma personalidade muito forte. É fácil esquecer o passado dela
e como ela se magoa com facilidade.
– Então o que eu faço?
– Só você pode responder
isso. Meus dias como seu Grilo Falante já passaram há muito tempo.
– Acabaram os sermões sobre
a vida, é? Que ótimo. Justamente quando eu precisava de um.
Do outro lado da linha, o
barulho de fumaça sendo assoprada.
– Eu sei que ela vai estar
na sala de edição da KTVS à uma hora.
– Tem certeza?
– Foi o que ela me disse.
– Obrigada, mamãe. Eu te
amo.
– Também te amo.
Selena desligou o telefone
e voltou correndo para o quarto, onde se vestiu rápido e passou um pouco de
maquiagem. Basicamente corretivo, para cobrir as espinhas que haviam pipocado
na sua testa desde a briga das duas. Atravessou o campus em tempo recorde. Foi
fácil. Naquela altura do mês, as pessoas estavam ocupadas, estudando para as
provas finais. Na porta da KTVS, fez
uma pausa, preparou-se como se estivesse indo para uma batalha, e entrou. Encontrou
Demi onde a mãe dissera: numa ilha de edição, debruçada sobre uma pilha de
fitas. Quando Selena entrou, ela ergueu o olhar.
– Ora, ora – disse,
levantando e se endireitando. – Se não é a líder das moralistas de plantão.
– Eu sinto muito – disse Sel.
Demi fez uma careta, como
se estivesse prendendo a respiração, e por fim a soltou.
– Você foi uma verdadeira
vaca.
– Eu não devia ter dito
tudo aquilo. É só que… nós nunca escondemos nada uma da outra.
– Então este foi o nosso
erro.
Demi engoliu em seco e
tentou sorrir. Não conseguiu.
– Eu não a magoaria de
propósito por nada no mundo. Você é a minha melhor amiga. Eu sinto muito.
– Jure que não vai
acontecer de novo. Nenhum cara vai voltar a ficar entre
nós.
– Nunca.
Selena foi absolutamente
sincera. Se precisasse grampear a própria língua para não repetir aquele erro,
faria isso. A amizade das duas era mais importante do que qualquer
relacionamento. Namorados vão e vêm, amigas são para sempre.
– Agora é a sua vez.
– O que você quer dizer?
– Jure que não vai mais
virar as costas para mim e ficar sem falar comigo. Os
últimos três dias foram horríveis.
– Eu juro.
Demi não sabia muito bem
como havia acontecido, mas, de alguma forma, dormir com o professor se
transformara num caso de amor verdadeiro. Talvez Selena estivesse certa, e a
história tivesse começado como uma espécie
de investimento na carreira para ela. Mas não se lembrava mais. Tudo o que realmente
sabia era que, nos braços dele, ela se sentia contente, e essa era uma emoção
nova. E, é claro, ele era seu mentor. No tempo que
passavam juntos, ele lhe ensinava coisas que ela levaria anos para descobrir
sozinha. O mais importante: ele havia lhe mostrado como era fazer amor. A cama dele
havia se tornado seu porto seguro. Os braços dele, sua boia salva-vidas. Quando
Demi o beijava e o deixava tocá-la com uma intimidade inimaginável, ela se
esquecia que não acreditava no amor. A primeira vez, naquele bosque escuro em
Snohomish, foi desaparecendo aos poucos de sua memória, até que um dia, afinal, descobriu que não carregava mais aquilo dentro de si. Sempre seria
parte dela, uma cicatriz em sua alma, mas, como todas as cicatrizes, havia se
transformado de algo chamativo e vermelho em uma linha fina e clara que só podia ser vista às vezes. Mas, mesmo com tudo
isso, com tudo o que ele havia mostrado e dado a ela, estava começando a não
ser o bastante. No primeiro semestre de seu ano de formatura, Demi estava
começando a ficar impaciente com o mundo
tranquilo da universidade. A CNN havia mudado a cara do telejornalismo. No
mundo real, as coisas estavam acontecendo, coisas importantes. John Lennon
havia sido assassinado do lado de fora do prédio onde morava em Nova York. Um cara
chamado Hinkley atirara no presidente Reagan numa tentativa patética de impressionar
Jodie Foster. Sandra Day O’Connor se tornara a primeira mulher na Suprema
Corte. Diana Spencer havia se casado com o príncipe Charles numa cerimônia de
conto de fadas tão perfeita que todas as meninas dos
Estados Unidos passaram o
verão inteiro acreditando no amor e em finais felizes.
Selena falava sobre o casamento com tanta frequência e com tanta riqueza de
detalhes que dava para imaginar que ela havia sido convidada. E tudo isso havia
sido manchete. Fatos ocorridos durante a vida de Demi. Porém, como ela estava
na faculdade, ocorreram antes do seu tempo. Claro que
ela havia escrito artigos
sobre essas notícias para o jornal universitário, e às vezes inclusive lia
alguns trechos no ar, mas era tudo de faz de conta, exercícios de aquecimento
para um jogo que ela ainda não tinha permissão de jogar. Ela ansiava por nadar
nas verdadeiras águas das notícias locais ou nacionais. Havia ficado ainda mais
cansada das festas das repúblicas e do zum-zum-zum que se fazia cada vez que
alguém ficava noiva. Fugia à sua
compreensão por que todas aquelas garotas das repúblicas queriam isso para suas
vidas. Elas não sabiam o que estava acontecendo no mundo, não viam as
possibilidades? Ela havia aproveitado tudo o que a Universidade de Washington
tinha a oferecer, frequentado todas as aulas de telejornalismo e jornalismo
impresso importantes e aprendido o que pudera durante um ano de estágio na
emissora pública. Estava na hora de entrar no feroz mundo do noticiário de TV.
Queria se enfiar numa multidão de
repórteres e se acotovelar entre todos até chegar à frente.
– Você não está pronta –
disse Joseph, com um suspiro.
Era a terceira vez que ele
dizia isso em três minutos.
– Você está errado – disse
ela, inclinando-se na direção do espelho acima da cômoda e passando mais uma
camada de rímel.
Nos deslumbrantes primeiros
anos da década de 1980, não havia excesso de maquiagem ou cabelos armados
demais.
– Você me preparou, e nós
dois sabemos disso. Você me fez deixar os cabelos com essa aparência sem graça,
estilo Jane Pauley. Todos os meus blazers são pretos e meus sapatos parecem os
de uma dona de casa de subúrbio. Pôs o bastão do rímel de volta no tubo e o girou
lentamente, depois examinou as unhas postiças que havia colocado naquela manhã.
– Do que mais eu preciso?
Joseph se sentou na cama.
Daquela distância, ele parecia ou entristecido ou cansado da discussão. Ela não
sabia ao certo o quê.
– Você sabe a resposta
dessa pergunta – disse ele de forma suave.
Ela revirou a bolsa em
busca de outra cor de batom.
– Estou cansada da
faculdade. Preciso entrar no mundo real.
– Você não está pronta, Demi.
Um repórter precisa ter a mistura perfeita de objetividade e compaixão. Você é
objetiva demais, fria demais. Esta era a crítica que a incomodava, e ele sabia
disso. Ela passara anos sem sentir nada. Agora, de repente,
devia ser compassiva e objetiva ao mesmo tempo.
Empática, mas profissional. Não conseguia
fazer isso direito, e tanto ela quanto Joseph sabiam disso.
– Eu ainda não estou
falando em rede nacional. É só uma entrevista para um emprego de meio período
até a formatura. Demi foi até a cama. Com o terninho preto e a camisa branca,
era o retrato da elegância conservadora. Havia inclusive domado a sensualidade
dos cabelos na altura dos ombros ao prendê-lo num coque banana. Sentada na
beira do colchão, afastou uma mecha de cabelos dos olhos dele.
– Você simplesmente não
está pronto para me soltar no mundo.
Ele suspirou e tocou no
queixo dela com o nó dos dedos.
– É verdade que eu prefiro
você na minha cama a fora dela.
– Admita: eu estou pronta.
Ela tinha a intenção de
parecer sexy e adulta, mas o tremor vulnerável na voz a traiu. Ela precisava da
aprovação dele da mesma forma como precisava de ar e de sol. Claro que
conseguiria seguir em frente sem ela, mas com menos confiança. E naquele
momento ela precisava de toda a confiança que
pudesse angariar.
– Ah, Demi – disse ele,
afinal. – Você nasceu pronta.
Sorrindo triunfantemente,
ela o beijou – com vontade –, então se levantou e pegou a pasta de vinil.
Dentro dela havia um punhado de currículos impressos em papel marfim grosso, vários cartões de visita que diziam Demetria Lovato, repórter de TV e uma fita com uma matéria que ela havia feito ao vivo para a KVTS.
– Quebre a perna – Joseph
disse.
– Pode deixar.
Demi pegou o ônibus na
frente da banca do Kidd Valley Hamburger. Embora fosse formanda, não levara seu
carro para a faculdade. Estacionar era difícil e caro. Além disso, os Gomez
adoravam a lata-velha de sua avó. Por todo o trajeto do distrito da
universidade até a ponte do lago Union, pensou sobre o que sabia a respeito do
homem com quem iria se reunir. Aos 26 anos, ele já era um respeitado
ex-repórter que havia ganhado alguns importantes prêmios de jornalismo durante
um conflito na América Central. Alguma
coisa – nenhum dos artigos dizia o que – o havia trazido de volta para casa,
onde ele mudara o rumo da carreira. Agora, era produtor do menor escritório de
uma das estações de TV locais. Demi havia ensaiado sem parar o que iria dizer. Prazer em conhecê-lo, Sr. Ryan. Sim, eu tenho uma
experiência impressionante para uma mulher da minha idade. Estou empenhada em
me tornar uma jornalista de primeira linha e espero, não, pretendo… O ônibus parou fazendo
barulho e fumaça na esquina da Rua 1 com a Broad. Demi desceu apressada.
Enquanto estava parada embaixo da placa do ponto consultando suas anotações,
começou a chover – não forte o bastante para exigir um capuz ou um guarda-chuva,
mas suficiente para estragar os
cabelos e borrar a maquiagem dos olhos. Abaixou a cabeça para proteger a
maquiagem e correu a quadra que a separava de seu destino. O pequeno edifício
de concreto com janelas sem cortinas ficava na
metade da quadra, com um estacionamento ao lado. Dentro dele, consultou o
quadro
na parede e encontrou o que
queria: KCPO – Sala 201. Endireitou a postura, sorriu profissionalmente e foi
até a sala 201. Lá, abriu a porta e quase deu um encontrão em alguém. Por um
instante, Demi ficou perplexa. O homem na
frente dela era lindo – cabelos pretos desalinhados, olhos azuis fortes e uma
barba rala. Nem um pouco parecido com o que estava esperando.
– Você é Demetria Lovato?
Ela estendeu a mão.
– Sou. Sr. Ryan?
– O próprio – disse, apertando
a mão dela. – Entre.
Ele a guiou através de uma
sala pequena repleta de papéis, câmeras e pilhas de jornais por todo lado. Duas
portas abertas revelavam outras salas vazias. Havia outro homem parado num
canto, fumando. Era enorme, com pelo menos 1,95 metro, cabelos loiros
desgrenhados e roupas com as quais parecia ter passado a noite. Sua camiseta
ostentava uma gigantesca folha de maconha.
Quando os dois passaram,
ele ergueu o olhar. – Esta é Demetria Lovato – o Sr. Ryan a apresentou.
– É a das cartas? –
resmungou o sujeito grandalhão.
– Ela mesma – confirmou o Sr. Ryan, sorrindo para Demi. – Ele é o Mutt. Nosso
cinegrafista.
– Prazer em conhecê-lo, Sr.
Mutt.
Isso fez os dois darem
risada, e o barulho da risada deles apenas confirmou sua
ansiedade de que era jovem demais para aquilo.
Ele a levou até uma sala de
canto e apontou para uma cadeira de metal diante de uma mesa de madeira.
– Sente-se – disse,
fechando a porta atrás de si.
Ele se sentou atrás da mesa
e olhou para ela.
Demi endireitou a postura,
tentando parecer mais velha.
– Então é você que anda
entupindo a minha caixa de correspondência com fitas e
currículos. Tenho certeza de que, com toda a sua ambição, você pesquisou a
nosso respeito. Nós somos a equipe de Seattle que trabalha para a KCPO em
Tacoma. Não temos programa de estágio.
– Foi o que as suas cartas
disseram.
– Eu sei. Eu as escrevi.
Ele se recostou na cadeira
e pôs as mãos atrás da cabeça.
– Você leu meus textos e
viu a minha fita?
– Na verdade, é por isso
que você está aqui. Quando me dei conta de que você não iria parar de me mandar
fitas de testes, achei que
era melhor assistir a uma.
– E aí?
– E você vai ser boa um
dia. Tem o que é preciso…
Um dia? Vai ser?
– Mas ainda está longe de
estar pronta.
– É por isso que quero este
estágio.
– O estágio que não existe,
você quer dizer.
– Eu posso trabalhar de
vinte a trinta horas por semana de graça, e não me importo se vou receber
créditos para a faculdade ou não. Posso escrever textos, fazer checagens e
pesquisa. Qualquer coisa. O que você tem a perder?
– Qualquer coisa? – repetiu
ele, e agora a olhava com atenção. – Você faria café, passaria aspirador e
limparia os banheiros?
– Quem faz tudo isso hoje?
– O Mutt e eu. E a Carol,
quando ela não está fazendo reportagem.
– Então eu certamente farei
isso.
– Então você fará o que for
preciso.
– Sim.
Ele se recostou na cadeira,
observando-a com atenção.
– Você entende que será pau
para toda obra e não receberá nada por isso.
– Entendo. Posso trabalhar
às segundas, quartas e sextas.
– Está bem, Demetria Lovato
– disse ele por fim, e se levantou. – Vamos
ver o que você pode fazer.
– Deixe comigo – respondeu
ela, com um sorriso. – E é Demi.
Ele a levou de volta até a
sala principal.
– Ei, Mutt, esta é a nossa
nova estagiária, Demi Lovato.
– Legal – disse Mutt, sem
levantar os olhos da câmera que tinha no colo.
Na porta, o Sr. Ryan fez
uma pausa e olhou para ela.
– Espero que tenha a
intenção de levar este trabalho a sério, Srta. Lovato. Ou esta será uma
experiência com prazo de validade menor do que o do leite.
– Pode contar comigo, Sr.
Ryan.
– Pode me chamar de Nick.
Vejo você na sexta-feira. Às oito da manhã?
– Estarei aqui.
Ela passou e repassou o
encontro em sua mente enquanto caminhava rapidamente pela rua até a parada de
ônibus. Na realidade, ela havia acabado de criar o próprio estágio. Um dia,
quando Phil Donahue a entrevistasse, ela contaria essa história para demonstrar
sua determinação e ousadia. Sim, Phil. Foi uma
atitude ousada, mas você sabe como é o telejornalismo. É um mundo muito competitivo,
e eu era uma garota que sonhava alto.
Mas ela contaria a Selly
primeiro. Nada era totalmente perfeito até ela compartilhar com a amiga. Aquele
era o começo do sonho delas. As cerejeiras marcavam a passagem do tempo melhor
do que qualquer calendário. Com botões cor-de-rosa fartos na primavera,
extremamente verdes nos dias quentes e tranquilos de verão, lindamente
matizados no começo das aulas e, agora, nuas naquele dia de novembro de 1981. Para
Sel, a vida estava andando rápido demais. Ela estava anos-luz de distância da
garota tímida e quieta que era ao chegar à universidade. Nos anos que passara
na Universidade de Washington, havia aprendido a dirigir esquetes da semana de
apresentação de calouros, a organizar e planejar uma festa para trezentas
pessoas, a entornar um copo de cerveja e comer ostras cruas, a interagir com
todos numa festa de república e se sentir confortável com pessoas que não
conhecia, a escrever reportagens, a escolher o melhor ângulo para fazê-las
ganhar a primeira página, e também a filmar
essas mesmas reportagens. Seus professores lhe davam notas altas e lhe diziam
sempre que ela tinha talento para o jornalismo. O problema, aparentemente, era
seu coração. Ao contrário de Demi, que era capaz de ir em frente e fazer
qualquer pergunta, Selena achava difícil se intrometer na dor das pessoas. Cada
vez mais, ela deixava de lado suas próprias reportagens e preferia editar as de
Demi. Ela não tinha o que era necessário para ser produtora de notícias de uma TV
em rede nacional nem uma repórter de primeira linha. Todos os dias, quando
comparecia às aulas de telejornalismo e comunicação, estava mentindo para si
mesma. Ultimamente, sonhava com outras coisas. Pensava em entrar para a faculdade
de direito para poder combater as injustiças sobre as quais escrevia, em
escrever romances que fizessem as pessoas verem o
mundo de uma maneira melhor, mais positiva… ou – e este era o sonho mais
secreto de todos – se apaixonar. Mas como ela poderia dizer essas coisas a Demi?
Demi, que havia segurado sua mão tantos anos antes, quando ninguém mais fazia
isso, que havia criado o sonho diáfano de suas vidas como parceiras no noticiário
de TV. Como ela poderia dizer à melhor amiga que não compartilhava mais do
sonho dela? Deveria ser algo fácil de dizer. Elas eram meninas na época em que decidiram
embarcar numa vida em conjunto. Nos anos que se passaram desde então, o mundo
havia mudado muito. A guerra no Vietnã havia sido perdida, Nixon havia
renunciado, o monte Santa Helena entrara em erupção e a cocaína havia se
popularizado junto a uma nova geração de festeiros. O time de hockey dos EUA
havia obtido uma vitória milagrosa nas Olimpíadas e um ator de segundo escalão
fora eleito presidente. Dificilmente sonhos poderiam se manter estáticos em
tempos de tanta incerteza. Ela simplesmente teria de enfrentar Demi, para
variar, e lhe dizer a verdade, dizer esses são seus sonhos, Demi , e eu tenho orgulho
de você, mas não tenho mais 14 anos e não posso segui-la para sempre.
– Quem sabe hoje – disse
ela em voz alta, arrastando a mochila enquanto caminhava pelo campus cinzento e
nebuloso.
Se ao menos ela tivesse seu
próprio sonho, alguma coisa para substituir o da dupla de estrelas do
jornalismo televisivo… Demi talvez aceitasse isso. O vago Eu não sei de Selena não seguraria muito a Tempestade Tropical Demi. Na saída
do campus, ela se misturou ao fluxo de alunos e atravessou
a rua, sorrindo e acenando para amigos ao passar por eles. Na casa da
república, foi direto para a sala de estar, onde as garotas estavam sentadas
nos sofás e nas poltronas e por todo o tapete verde-claro. Atirou a mochila no
chão e encontrou um lugar para sentar entre Charlotte e Mary Kay.
– Já começou?
Umas trinta pessoas pediram
silêncio quando a música-tema da novela começou a tocar. O rosto de Laura
encheu a tela da TV. Ela estava linda e esvoaçante num maravilhoso vestido
branco. Um suspiro coletivo percorreu a sala. Então Luke apareceu em seu terno
cinza, sorrindo para a noiva. Exatamente neste instante, a porta da república
se abriu num estrondo.
– Sel! – berrou Demi,
entrando na sala.
– Psiiiiiu – todas fizeram
em uníssono.
Demi se agachou atrás de Sel.
– Precisamos conversar.
– Psiu. Luke e Laura estão
se casando. Você pode me contar da sua entrevista (você conseguiu: parabéns)
quando terminar. Agora fique quieta.
– Mas…
– Psiu.
Demi se ajoelhou,
resmungando.
– Como vocês todas podem ficar tão malucas por um branquelo magricela com um cabelo
horroroso? Ele é um estuprador. Eu acho…
– PSIIIU!
Demi suspirou
dramaticamente e cruzou os braços.
Assim que o capítulo
terminou e a música começou a tocar de novo, ela se levantou.
– Vamos lá, Selly.
Precisamos conversar.
Ela agarrou a mão da amiga
e a levou para longe da falta de privacidade da sala de TV, percorrendo os
corredores e descendo um lance de escada até o local secreto da república: o
fumódromo. Era uma sala minúscula, atrás da cozinha, com dois pequenos sofás,
uma mesa de centro repleta de cinzeiros cheios e o ar tão espesso e azulado que
os olhos lacrimejavam, mesmo quando não havia ninguém lá. Era o lugar aonde se
ia para fazer as fofocas pós-festas e para dar risada tarde da noite. Selena detestava
aquele lugar. O hábito que lhe parecera tão bacana e rebelde aos 13 anos de
idade agora era nojento e idiota.
– E então? Conte tudo. Você
conseguiu o estágio, certo?
Demi sorriu.
– Consegui. Segundas,
quartas e sextas. Alguns finais de semana. Estamos no
caminho, Selly. Vou me sair bem neste trabalho e, quando nos formarmos, vou
convencê-los a contratarem você. Seremos uma equipe, exatamente como sempre
dissemos que seríamos. Selena respirou fundo. Vá em frente. Conte a ela.
– Você não deveria se
preocupar comigo, Demi. Este é o seu dia, o seu começo.
– Não seja ridícula. Você
ainda quer que formemos uma equipe, não quer?
Demi fez uma pausa e
encarou Sel, que juntou coragem e abriu a boca. Então Demi riu.
– É claro que quer. Eu sabia.
Você só estava brincando comigo.
Engraçadinha. Vou falar com
o Sr. Ryan, que é o meu novo chefe, assim que ele não puder mais viver sem mim.
Agora, preciso correr. Joseph quer saber da entrevista, mas eu precisava contar
para você primeiro. Demi a abraçou com força e saiu.
Selena ficou lá parada, na saleta feia que fedia a cigarros velhos, olhando
para a porta aberta.
– Não – disse ela baixinho.
– Eu não quero fazer isso.
Não havia ninguém
escutando.
buuuuuu! to amando a história. Joseph seu pedófilo sai de perto da Demetria. hahahahha parei. UUUm vai ter nelena é? interessante hahahahahahha. eu demorei pra alcançar pq os capítulos são grandes e ler tudo de vez cansa, sorry a demora ;s
ResponderExcluirPosta logo *-*
beijEMI
Amei ! Posta logo flor !!!!
ResponderExcluirTe amo e amo todas as suas fics , são todas maravilhosas e tô amaaaandooooo essa história tá muito diva !
Posta logo por favor ?!!!!
By - Milena...!!! ;)