segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

CAPÍTULO 11



Joe quis negar a afirmação de Demi, mas sabia que isso atiçaria a curiosidade de Diana.
-Vou para casa. Diga-me quando eu vou poder me livrar de você.
Ela se levantou e o seguiu até a porta, saiu no corredor e encostou a porta.
- Obrigada pelo jantar - disse ela, com educação.
- Obrigado por me deixar entrar quando desci com a pizza - disse ele com uma expressão séria, com vontade de rir da postura formal dela. Em vez de rir, ele a beijou novamente.
O beijo não foi tão intenso quanto o primeiro. Foi breve demais e acabou depressa demais. Mas ele sabia que os pais dela estavam logo ali e não queria levantar mais suspeitas.
- Eu sei - disse ele, tocando o queixo dela, antes que ela dissesse algo.
Depois disso, ele se virou e partiu em direção às escadas, sem esperar pelo elevador.
Ele entrou em seu apartamento pensando em Demi. Não que isso importasse. Ela era apenas uma vizinha, prestes a se mudar. Eles dividiram uma pizza, qual o problema? Mas os beijos foram algo a mais...
Será que a mãe dela era tão intransigente quanto Virginia? Será que exigiria respostas as quais Demi não estava disposta a dar?
Era melhor deixar as coisas esfriarem. Já comeram duas vezes juntos. Logo ela se mudaria. Ele ainda tinha sua vida de solteiro intacta. Sem perigo de se apaixonar por uma jovem bonita, especialmente uma que estava grávida e cuja sogra aparecia a todo instante. Se a sogra não parasse de fazer isso, Demi nunca encontraria um homem disposto a se casar com ela e cuidar do bebê.
Pensar na mãe sempre deixava Joe deprimido. Ele sacudiu a poeira e começou a busca por canais de TV. Teria de haver algo que distraísse sua cabeça da bela vizinha de lábios quentes.
-Bem, nada mal - disse Demi à sala vazia depois que os pais partiram. Diana se conteve no que diz respeito à presença de Joe. Eddie apenas tinha olhos para Diana e, nesse caso, Demi não precisava se preocupar com o padrasto examinando sua vida. Mas ela esperou que algo mais acontecesse. Certamente, ela não seria capaz de ir para a cama e descansar sem que algo acontecesse. E aconteceu. Meia-hora depois o telefone tocou.
- Ei, amiga, tudo bom? - era Selena.
- Ai, que bom que é você - disse ela.
- Quem mais ligaria a essa hora? - perguntou Selena.
- Virginia, minha mãe...
- Ô, menina seja sincera! O que a está deixando maluquinha assim?
- Joe.
- Ei, um momento, quem é Joe? Ah, é aquele rapaz bonitão do parque?
- Ele é um vizinho.
-Hã?
Demi explicou o que aconteceu nos dois últimos dias. Quando ela o mencionou casualmente, achou que Selena viajaria pelo fio do telefone até ali.
- Fale tudo. Não acredito que você o beijou. Já estava achando que você fosse virar freira.
- Calma, Selena. Ainda estou de luto.
- Querida, você está viva. Foi apenas um beijo. Qual o problema?
Ela e Zac eram namorados de escola. Demi sabia desde os 16 anos que queria passar o resto da vida com ele. Como podia pensar em outro homem?
- Demi, ainda está aí? - perguntou Selena.
- Sim. Não há problema, eu acho.
- A não ser que você queira mais...
- Claro que não. Só foi um beijinho.
-Hum, sei... E a mudança? Vai ser quando?
-Em breve.
- Quero conhecer esse Joe. Que tal você me convidar para um jantar com vocês dois?
-Nada disso. Vamos mudar de assunto. O que você tem feito?
Selena contou-lhe todas as novidades do fim de semana, o que, diga-se de passagem, foram muitas. Principalmente os homens... Demi não sabia como sua amiga tinha tantos encontros e nunca se acertava com ninguém. É claro, essa era uma ótima maneira de se divertir sem se envolver por completo. Nada de compromisso para Selena até se formar na faculdade! Ela disse isso mais de uma vez.
Depois que Selena desligou, Demi ficou impaciente. Preparou um chá de camomila e andou de um lado a outro em seu pequeno apartamento. Logo ela se mudaria para o lugar onde chamara de lar a maior parte da vida. As coisas voltariam à rotina. As aulas retornariam no outono, e ela esperava fazer algum acordo com os professores para que pudesse se afastar das aulas quando o bebê nascesse.
Tinha muito o que fazer antes do bebê nascer, mas não conseguia inventar listas tal como Virginia gostava e não queria ir às compras como sua mãe desejava.
Finalmente, o chá a acalmara o suficiente para que dormisse.
Nos próximos dias, Demi fez o melhor que pôde para ignorar o vizinho de cima. Terminou de embalar suas coisas e deixou tudo empilhado perto da porta. Não seria muito difícil mudar-se para o outro lado da cidade.
Ela se aventurou ao parque algumas vezes, escolhendo um horário diferente do de Joe. Ela o vira uma vez na volta para casa. Estava de saída, cumprimentando um amigo que o esperava no carro.
Apesar de se esforçar para não prestar atenção nele, Demi fez de tudo para ver quem estava dirigindo. Um outro rapaz. O alívio a deixou surpresa. Ela não tinha nada a ver com Joe, ele não a pertencia.
Joe acenou antes de entrar no carro. Ela ergueu a mão, desejando muito que ele passasse a tarde com ela.
Quando Demi chegou no apartamento, telefonou para Diana.
- E então, mãe? Como vai?
- Estou louca fazendo as malas! Além do mais, estou esperando as entregas dos móveis do bebê! Achei que conhecer a Grécia fosse uma boa ideia, mas agora já estou duvidando um pouco.
- Posso receber as entregas, se você quiser - ofereceu Demi. - Por que não me pediu?
- Sei que está ocupada.
-Nem tanto. Na verdade, estou sem ter o que fazer.
- Oh, querida. Quer ir conosco?
- Não, mãe, eu não quero viajar.
- Por que não?
- Ah, não pretendo ficar incomodando um casal. Vão vocês dois e se divirtam. É só me falar quando eu preciso estar na sua casa.
- Os móveis do bebê vão ser entregues na sexta-feira. Montaremos a cama e o resto quando voltarmos. Se você não se importar de vir e deixar o pessoal da entrega entrar...
- Não se preocupe, mãe. O que mais? Demi anotou os detalhes, feliz por ter algo com o que se preocupar pelos próximos dias. Talvez ela devesse aceitar a ajuda de Joe para se mudar a fim de acabar logo com isso. Ela podia passar o tempo arrumando sua nova casa.
- Isso é tudo - disse Diana. - Você vai ficar bem?
- É claro. Vão e divirtam-se.
- Como está Virginia?
- Até agora tudo bem. Ela tem ligado uma vez por dia, mas ainda não passou por aqui. Ela atribui minha atitude aos hormônios!
Diana riu.
-Ai, Ai! Que louca! E o Joe? Está saindo com ele?
-Não... É só um vizinho. Eu o vi hoje. Ele estava com um amigo.
- Gostei dele.
- Eu também. Mas ainda é muito cedo para sair com alguém - disse Demi.
-Não necessariamente. Zac não ia querer que você ficasse solteira.
- É verdade. Mas tenho tanto com o que me preocupar, com o bebê e todo o restante, que não tenho tempo para novos relacionamentos. E, além disso, quantos homens estão dispostos a assumir uma família?
-Muitos deles! Ainda mais se isso incluir a minha filhinha linda. Demi sorriu.
- Mamãe, você é suspeita para falar.
-Não sobre meus filhos! - Bem, vou indo. Obrigada, querida, por tomar conta de tudo por mim.
- Divirta-se - disse Demi. Ela desligou o telefone lentamente, sentindo uma onda de tristeza varrer o corpo.
Sua mãe parecia tão feliz! Diana tinha Eddie, uma vida empolgante e, em breve, teriam um bebezinho para completar a família. Demi sabia que sempre seria parte da vida de sua mãe, mas nada mais seria como antes. Os dois teriam sua própria família.
Era bem possível que a mãe tivesse mais filhos com ele. Demi nunca viveria com os irmãos, nunca os conheceria bem, e nunca viveria diariamente com eles. Ela seria uma espécie de tia.
De repente, começou a chorar. Sentia falta de Zac. Sentia falta da vida que planejara dividir com ele. Tinha medo de ter um bebê sozinha. As lágrimas ficaram mais intensas. Como Zac pôde morrer assim! Ele era tão jovem, tinha a vida toda pela frente! Não deveria ter sido morto em um país distante por um soldado que nunca vira antes.
Demi não fazia idéia de quanto tempo passou chorando. O coração parecia despedaçado. Ela tentava com todas as suas forças manter a compostura, mas isso só piorava as coisas.
- Demi? - uma forte batida ressoou pela porta. Ela se sentou, prendendo a respiração. Não queria ver ninguém. Muito menos Joe.
- Demi, abra a porta. Posso ouvir você daqui. O que houve?
-Nada. Vá embora!
- Abra a porta, eu não vou sair daqui.
Ela ficou de pé, assoando o nariz e enxugando os olhos mais uma vez. Abriu a porta e olhou para Joe.
- Estou bem. Pode ir.
Ele empurrou a porta e entrou no apartamento, abraçando-a.
- Qual o problema, querida? - a voz dele era tão carinhosa que ela desatou a chorar novamente. Ela se sentiu bem nos braços dele. Joe a acariciava com a mão sem o gesso. O rapaz não falou muito, mas suas palavras eram confortantes.
E, finalmente, ela ficou exausta. Descansou o rosto contra o peito dele e ficou ouvindo as batidas do coração. O calor dele diminuía seu medo.
- O que aconteceu? - perguntou Joe.
- Nada. Acho que é um acúmulo de várias coisas que estão acontecendo na minha vida.
- Como o quê?
- O fato de estar sozinha, de ter de cuidar do bebê sozinha. Da felicidade da minha mãe.
- E isso não é uma coisa boa?
- É sim. Estou feliz por ela. Mas isso também deixa claro o quanto sou infeliz.
- Não entendi - disse ele. Você me parece feliz. Sei que deve sentir falta de seu marido, mas você já começou a se recuperar e a seguir em frente. Viva um dia de cada vez.
Ela balançou a cabeça em um gesto positivo.
- Vá molhar o rosto e depois vamos dar uma caminhada. O ar fresco vai lhe fazer bem - disse ele, encaminhando-a ao banheiro.
- Você não precisa ficar, estou bem.
- Então, quer ir à praia comigo?
Demi foi lavar o rosto e ficou surpresa ao vê-lo avermelhado e os olhos inchados. Era surpreendente o fato de Joe não ter corrido feito louco depois de dar uma olhada para ela. Em vez disso, ele a convidara para uma caminhada na praia.
Dez minutos depois, ela entrou em um carro esporte conversível.
-O meu padrasto tem um carro conversível. Acho que minha mãe gosta mais do carro do que o meu padrasto - disse Demi, colocando o cinto de segurança. Os dois partiram rumo à praia.
Estacionaram em um espaço com apenas alguns outros carros. Durante a semana, as praias não ficavam lotadas.
A brisa soprava constantemente da água, fresca e fria. Caminhando pela areia da praia, eles foram em direção à área mais próxima à água. As ondas quebravam perto deles, mas longe o suficiente para não molhá-los. Quando a maré recuava, a areia molhada brilhava sob o sol.
Os dois caminhavam em silêncio. O som das ondas e das gaivotas eram a trilha sonora perfeita. Demi começou a relaxar, sentindo-se rejuvenescida por estar perto do mar. Eram poucas as pessoas que nadavam naquela água fria.
Ela tropeçou e Joe rapidamente a segurou para que não caísse. Em seguida, pegou na mão dela.
Demi sentiu o toque dele ressoar por todo o corpo. O coração batia acelerado e o arrepio que sentiu chegou a níveis altíssimos.
-Que maravilhoso! - disse ela, afastando-se levemente dele. - Eu adoro o mar.
- Eu também gosto. A primeira vez que vim foi há sete anos, quando me mudei para São Francisco. Passei meu segundo dia na cidade caminhando pela praia, impressionado com a quantidade de água. Às vezes, acho que deveríamos aproveitá-la de uma forma melhor para apagar incêndios.
- Uma enorme mangueira vindo direto do oceano!- disse Demi.
- Seria uma ótima ideia!
- Seu trabalho é tão perigoso! - disse ela devagar, observando as ondas quebrarem.
-Existe um certo perigo, mas dirigir é mais perigoso ainda... Demi tremeu.
- Você está com frio? - perguntou Joe, passando o braço em volta dos ombros dela.
- Não. Apenas pensando em como nunca sabemos quando a vida termina.
- Ou começa. Você e sua mãe estão prestes a viverem algo muito interessante em suas vidas. Parece estranho pensar que duas gerações estarão fazendo a mesma coisas, mas você terá alguém com quem compartilhar os momentos ruins e os bons.
Demi concordou com ele. Por um momento, ela os viu como namorados, caminhando à beira do mar, compartilhando a vida... Mas não eram namorados. E ela não queria pensar sobre tal coisa. Precisava se lembrar de Zac. E lembrar-se também de que, se fosse amar alguém de novo, seria um homem que trabalhasse em algo seguro.
-Você já apagou algum incêndio nessas florestas da Califórnia que acontecem todos os anos?
- Eu fui trabalhar em um enorme em Los Angeles há uns dois anos. Geralmente, nossas unidades não são chamadas para isso.
- Você nunca tem medo? Ele deu de ombros.
- Não há tempo para se ter medo quando se está fazendo o trabalho. Nós normalmente fazemos uma reunião para falar sobre o que fizemos, o que deu errado e como combater tais tipos de incêndios da próxima vez. Isso nos deixa bem preparados.
- Você não estava preparado o suficiente para evitar que caísse daquele prédio e quebrasse o braço?
- O inesperado acontece. Mesmo assim, considero meu trabalho o melhor que há.
- Você é um T.E.M.? - perguntou ela, referindo-se ao treinamento "Técnico em Emergências Médicas", um curso de extensão em primeiros socorros.
- Eu tirei o certificado há uns dois anos - disse ele.
- Mas ainda assim você combate incêndios?
- Se algum dos T.E.M. não puder comparecer, assumo aposição temporariamente. Mas, normalmente, combato incêndios.
Ela fez um gesto positivo com a cabeça e se virou para caminhar. Já estava com os pensamentos organizados. Mesmo se estivesse interessada no rapaz, não havia como ela arriscar o coração por uma segunda vez com um homem que flertava com o perigo diariamente. Ela se mudaria para o novo  apartamento e esqueceria Joe para sempre.
Joe caminhava ao lado dela. Sentiu que ela não gostava do seu trabalho. Isso era óbvio. Entretanto, era um ótimo trabalho, no qual ele era  muito bom e, além disso, esperava uma promoção a qualquer momento. Com um pouco de sorte, dentro de alguns anos, ele seria chefe de um quartel menor. Ou podia se juntar ao batalhão contra incêndios criminosos, ou quem sabe, trabalhar como paramédico. Ele tinha opções e oportunidades. Mas, no momento, gostava muito do que fazia.
Nunca pensara em como alguém veria seu trabalho. Sua mãe estava mais preocupada com ele, no que dizia respeito a ganhar dinheiro suficiente para se manter. Já havia sofrido dificuldades financeiras e não desejava isso para o filho.
Olhando mais uma vez para Demi, ele pensou em como transpor essa barreira. Queria vê-la mais vezes. Como nenhum dos dois estava à procura de um relacionamento duradouro, que mal haveria se eles passassem mais tempo juntos?
- Já andou pensando na mudança? - isso não foi uma pergunta inteligente, Joe, pensou ele.
- Para dizer a verdade, estou ansiosa. Sua oferta ainda me interessa, eu preciso mesmo de ajuda.
- Vou pedir a alguns dos rapazes. Sexta-feira está bom para você?
- Na sexta, não vou poder. Irei à casa de minha mãe. Eles estão esperando a entrega dos móveis do bebê e eu disse a eles que estaria lá para recebê-los, pois eles estarão em Atenas.
- Ah, é verdade, eles estão indo para a Grécia. Demi olhou para o relógio.
-A essa hora, já estão no aeroporto. Minha mãe adora viajar. Graças ao trabalho de Eddie, aposto que em breve ela terá conhecido o mundo inteiro.
- E você? Também gostaria de viajar? - perguntou ele.
Demi negou, balançando a cabeça. Eu talvez queira conhecer alguns lugares, no futuro, mas estou feliz onde vivo. Já vi a neve na serra durante o inverno. Já fui às praias quentes da Califórnia. Mas, apesar de tudo, prefiro ficar perto de casa.
Joe pensava o mesmo, agora que chamava São Francisco de lar. Ele não tinha a menor pretensão de voltar para Fresno, onde nascera e crescera. Logo que chegara a São Francisco, explorara todas as partes da cidade, do porto a Chinatown. Por ser bombeiro, conhecia todas as ruas e a maneira mais rápida de chegar a qualquer lugar. E na cidade, havia uma enorme quantidade de atividades: clubes, bares, danceterias e rodeios!
Mesmo assim, ele compreendia a solidão dela. Às vezes, era difícil encontrar alguém com quem fazer alguma coisa. A maioria das mulheres com quem saía parecia encarar um encontro como um prelúdio a um relacionamento mais sério. Eram raras aquelas que não estavam em busca de um marido.
Eles se sentaram em um dos bancos de frente para o mar.
- Obrigada por sugerir que viéssemos aqui -disse Demi.
O rapaz sorriu, mas permaneceu em silêncio. Ela era sempre muito educada. Será uma ótima mãe. Era mesmo lamentável o fato do marido dela ter morrido... De repente, Demi olhou para ele de um modo estranho. Um mau pressentimento.

- Acho que a gente não deveria se ver, depois que eu me mudar. Na verdade, talvez seja melhor você não me ajudar na mudança...

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